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sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Em 3 tempos: banda Catedral



1988 a 1998: “Aos ouvidos dos sensíveis de coração”
Quem assistiu ao definhar dos vívidos anos 80 num Brasil onde a maioria ainda respirava política – e o som que se ouvia ainda incitava à indignação – não poderia, ao passar pela porta de uma igreja protestante, esperar, do grupo que ali tocava, outra coisa que não fosse uma música que inspirasse sensações místicas ou coisa parecida.
Em se tratando, porém, de uma banda que atendia pelo nome altamente sugestivo de Catedral, não era exatamente essa a resposta que se teria, uma vez que o projeto que, a partir de então, seus músicos conduziriam pelos próximos 10 anos não se limitaria – como era natural que ocorresse com muitos outros artistas e grupos religiosos da época – ao já batido esquema de “Louvor e Adoração”. O Catedral trazia – além de um som perfeitamente sintonizado com o que havia de mais persuasivo em matéria de rock oitentista tanto nacional quanto estrangeiro – mensagens que, embora essencialmente religiosas, mostravam-se muitas vezes pinceladas por críticas de cunho político e social, sem falar naquele retoque – regradamente cristão – de romance.
Limitada à chamada cena gospel, a banda formada por Kim [nos vocais, guitarra base e violão], Cézar [na guitarra solo], Júlio Cézar [no baixo] e Guilherme [na bateria] seguiria conquistando espaço, reconhecimento, premiações e, acima de tudo, fãs – dotada, como era, de características que lhe conferiam, para o bem ou para o mal, certa excepcionalidade frente às demais bandas de seu tempo. Isto porque, enquanto a maioria dos grupos se destacavam, sobretudo, pelo som da guitarra, no Catedral dificilmente alguém, por menos atento que fosse, conseguiria concentrar quase todas as suas atenções noutro instrumento que não fosse o simplesmente fabuloso baixo de Júlio Cézar. Canções como Você; Ver Estrelas e Sorrir; Hoje e, dentre tantas outras, Teu Amor seriam suficientes para afastar qualquer desconfiança.
Por outro lado – e talvez aí esteja a principal “pedra de esquina” no caminho da banda – a sonoridade, embora própria, e, principalmente, a bela voz de Kim não passariam adiante sem despertar comparações com nada mais nada menos que a maior e mais representativa banda de rock nacional de todos os tempos, a Legião Urbana de Renato Russo. Às associações que se fariam entre a sua música e a do Legião, o Catedral – bem ou mal – se sairia alegando influências sonoras que, não por acaso, também estariam presentes no som dos rapazes de Brasília, como, por exemplo, as oriundas da banda The Smiths. Quanto às comparações entre a sua voz e a de Renato Russo, Kim ainda hoje delas se furta alegando influências de Elvis Presley – de quem é fã e para quem, aliás, dedicaria, juntamente com os demais colegas de banda, um disco de versões intitulado The Elvis Music.
Poucos discos lançados – e a convicção quanto à qualidade e à consistência do som que faziam – haveriam, naturalmente, de levar os músicos a esboçar, em letras mais romantizadas, figurativas ou, quando não, dúbias, a necessidade de romper os limites da carreira gospel e alcançar um maior número de ouvintes, o que viria a ocorrer somente em 1999, depois de pouco mais de 10 anos, quando o Catedral, já “do lado de fora do Véu do Templo”, poderia, apenas por um instante, olhar para trás e ver que – ali – deixava um belo trabalho …
1999 a 2003: “Para todo mundo ouvir”
Se por um lado, era preciso conhecer a fundo a obra do Legião para não confundir – ao ouvir pelas rádios – faixas como Uma Canção de Amor Pra Você ou Eu Quero Sol Nesse Jardim, por outro, nem precisaria conhecer tanto o Catedral para achar aquele som – e aquela voz – no mínimo, “familiares”. Com ousadia e, sobretudo, um conteúdo sonoro resistente à prova de fogo, o Catedral impunha a si mesmo o grande desafio de atravessar estreitos corredores de preconceito, indiferença e incompreensão, construídos por gente que se aplicasse bem os ouvidos à música do grupo, admitiria, ainda que no mais profundo de si, que Catedral é Catedral e Legião é Legião …
Ao mesmo tempo em que sugeria um rompimento com a carreira gospel, o disco Para Todo Mundo, lançado em 1999, permitia ao grupo alargar seus horizontes e conquistar, além de novos fãs, espaço na MTV e indicações a prêmios importantes. Mas nada disso sem provocar polêmicas, sobretudo, entre os fãs mais ortodoxos da fase gospel. Quem destes, outrora acostumados a versos inocentes como “a revolução do amor ao próximo e do amor a Deus acima de todas as coisas” não se “chocaria” ao ouvir declarações ultra românticas tais como “Eu amo mais você do que eu” ou mesmo versos levemente picantes do tipo “Eu quero flutuar sobre você” ? Polêmicas à parte, o fato é que apesar de, agora, utilizar uma linguagem acessível a todos os ouvintes, independentemente do seu posicionamento ideológico, a banda ainda transmitiria uma mensagem essencialmente cristã, embora estrategicamente metaforizada. Isso sem falar nos 3 importantes discos produzidos nesta nova fase de uma trajetória que, àquela altura, mostrava-se bela e promissora.
Para Todo Mundo, Mais Do Que Imaginei e 15º Andar traziam um Catedral musicalmente maduro. A guitarra discreta e precisa – mas, agora, levemente distorcida – de Cézar, o baixo sempre fenomenal de Júlio Cézar e a bateria suave e pontual de Guilherme, somados à voz e ao agradável violão de Kim, conferiam ao Catedral uma sonoridade, de um lado, notavelmente densa e, de outro, apaixonadamente melódica.
Para aquela banda – e apenas para aquela formação – era a unidade sonora perfeita, de modo que qualquer desfalque poderia representar considerável ameaça à qualidade preservada há anos. Não que a prematura morte de Cézar, em 2003, tenha colocado tudo a perder. Mesmo porque sua importância estava muito mais na peculiaridade que, enquanto integrante, conferia ao som da banda como um todo, do que em ser simplesmente o guitarrista. E mesmo assim, Cézar não partiria sem deixar bons registros, a exemplo do inesquecível e, por que não dizer, fantástico riff de Carpe Diem.
2003 até “o fechamento desta edição”: “Para um novo tempo começar”
Ainda na estrada, a banda tem atuado, praticamente, nas duas frentes, lançando trabalhos tanto “para todo mundo” quanto para o público gospel. Mas, coincidência ou não, a ausência de Cézar faz sentir-se justamente num momento da discografia do Catedral em que não se pode mais, pelo menos até “o fechamento desta edição”, ouvir um som tão convincente quanto o das duas últimas fases. Estranho ainda é ouvir um disco que se pretende comemorativo dos 20 anos de carreira [2008] e saber que, embora não represente a melhor das fases da banda, mereceria, sem sombra de dúvida, participações à altura do potencial e da história da mesma. E se outrora, quando ainda no mercado gospel, já manifestavam o desejo de – como sempre gostam de dizer – “desrotular” sua música, o que fariam, na prática, não seria mais do que assumir um novo rótulo, que de um legítimo rock nacional passaria a um inofensivo pop rock, oferecido, vez por outra, sob a estranha designação de MPB rock.
A despeito de tudo, entretanto, um dos traços mais marcantes em toda a trajetória do Catedral – e que continua claro como antes – é a persistência em romper limites que, apesar de naturais em toda caminhada, são, também, naturalmente necessários … “para um novo tempo começar”.
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