sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Podem as mulheres ser pastoras?




O papel da mulher na Igreja de Cristo é um assunto muito importante. Diferenças neste assunto têm dividido muitas igrejas e por isso não deve ser menosprezado. Sabemos que existem várias interpretações dos textos bíblicos e muitas opiniões diferentes quanto a este tema. Porém, esse assunto doutrinário importantíssimo está na categoria de assuntos não-essenciais, ou seja, de opinião e não devemos nos dividir por isso.




Eu entendo que Deus criou homens e mulheres iguais em importância, pois ambos são dotados da imagem divina (Gn 1:26-31) e reconheço que a Igreja não tem ensinado e praticado essa igualdade, esquecendo que as mulheres têm acesso a todas as bênçãos da salvação (At 2:17-18; Gl 3:26-28) e o elevado grau de respeito e dignidade que Jesus Cristo dispensou a elas (Grudem, 786).




No Novo Testamento existem dois textos-chave sobre esse assunto. Em 1Timóteo 2:11-14 parece que o apóstolo está se referindo ao culto público da igreja:




“11 A mulher deve aprender em silêncio, com toda a sujeição. 12 Não permito que a mulher ensine, nem que tenha autoridade sobre o homem. Esteja, porém, em silêncio. 13 Porque primeiro foi formado Adão, e depois Eva. 14 E Adão não foi enganado, mas sim a mulher que, tendo sido enganada, tornou-se transgressora”.




Neste contexto, as mulheres não têm permissão para ensinar nem ter autoridade sobre o homem.




O ensino e a autoridade são funções exclusivas de um pastor, presbítero ou bispo e é isso que Paulo está proibindo aqui. Aos pastores são requeridos os deveres de supervisão, ensino, pregação, direção, pastoreio e proteção da igreja contra as heresias. Portanto, as mulheres não podem ocupar oficialmente a função pastoral sem colidir com esta passagem doutrinária.




E isto também está baseado na ordem da criação, nos princípios estabelecidos por Deus para o homem e a mulher antes da queda e a entrada do pecado no mundo. Ao homem coube a liderança na família e foi a quebra deste princípio por Eva, que enganada por Satanás inverteu os papéis de masculino e feminino, pecou e conduziu seu marido ao pecado se tornando transgressora (Grudem, 787).




A outra passagem fundamental na nossa visão do papel da mulher na igreja também foi escrita por Paulo, só que para os irmãos na cidade de Corinto. Em 1Coríntios 14:33-36 o apóstolo, inspirado pelo Espírito Santo, está se referindo novamente à uma função exclusiva dos pastores:




“33 Pois Deus não é Deus de desordem, mas de paz. Como em todas as congregações dos santos, 34 permaneçam as mulheres em silêncio nas igrejas, pois não lhes é permitido falar; antes permaneçam em submissão, como diz a Lei. 35 Se quiserem aprender alguma coisa, que perguntem a seus maridos em casa; pois é vergonhoso uma mulher falar na igreja. 36 Acaso a palavra de Deus originou-se entre vocês? São vocês o único povo que ela alcançou?”




Observe no contexto o versículo 29 que diz assim:




"Tratando-se de profetas, falem dois ou três, e outros julguem cuidadosamente o que foi dito".




Parece que o contexto aqui é a avaliação e julgamento das profecias proclamadas publicamente na igreja.




Assim, entendemos que 1Coríntios 14:33b-36 está proibindo as mulheres de fazerem uma avaliação e julgamento das profecias na congregação, que seria uma função de autoridade sobre toda a igreja local e isto é exclusivo dos pastores.




Paulo não está proibindo as mulheres de falarem na igreja, pois em 1Coríntios 11:5 ele permite que elas falem (profetizem) na reunião pública da igreja:




“E toda mulher que ora ou profetiza com a cabeça descoberta desonra a sua cabeça; pois é como se a tivesse rapada”.




As filhas de Felipe profetizavam na Igreja de Cristo em Cesaréia (Atos 21:8-9):




“8 Partindo no dia seguinte, chegamos a Cesaréia e ficamos na casa de Felipe, o evangelista, um dos sete. 9 Ele tinha quatro filhas virgens, que profetizavam”.




Da mesma forma, as mulheres também profetizavam na Igreja de Cristo em Corinto.




Os ensinos paulinos em 1Timóteo 2 e 1Coríntios 14 não são incoerentes, pois nestes dois textos ele está preocupado em manter a liderança masculina (pastores, presbíteros ou bispos) no ensino e governo da igreja (Grudem, 788). Portanto, as mulheres não podem ser pastoras, presbíteras ou bispas na Igreja de Cristo.




Porém, o Senhor nosso Deus concedeu às mulheres dons para o exercício dos ministérios, liderança dos grupos de cristãos nas casas (células), obras missionárias, entre outras atividades na igreja. No culto público, com a permissão dos presbíteros (bispos ou pastores), elas também podem fazer uma oração, cantar, testemunhar, profetizar, ministrar uma palavra e etc.




Na minha opinião, as igrejas que ordenam mulheres para o ofício pastoral perdem pontos no quesito "pureza da igreja", mas isso não quer dizer que elas deixem de ser igrejas verdadeiras e que a nossa comunhão deva ser rompida. Pelo contrário, a unidade deve sempre ser preservada.




Graças a Deus, em nosso Movimento, a autonomia das congregações locais é inviolável. Ninguém e nenhuma associação, ministério ou instituição tem o direito de intervir na igreja em uma determinada localidade geográfica. Se uma igreja quer ordenar ou não as mulheres para o ministério pastoral, diaconal ou qualquer outro cargo ou função, que assim faça no exercício da sua liberdade e independência.




"Interpretações e deduções das Escrituras, embora podendo ser verdadeiras, não se podem transformar em mandamentos e ordenanças da Igreja. Opiniões divergentes quanto a tais interpretações não se deverão transformar em empecilho para se comungar na Igreja", assim decidiram os obreiros das Igrejas de Cristo no Planalto Central do Brasil em 1987 (As Marcas das Igrejas de Cristo).

Jack Cottrell, o mais conhecido teólogo contemporâneo das Igrejas de Cristo / Cristã





Jack Cottrell



Jack Warren Cottrell é o mais conhecido teólogo contemporâneo das Igrejas Cristãs / Igrejas de Cristo, que enviaram o pastor Lloyd David Sanders ao Brasil. É provável que ele seja o mais importante teólogo do Movimento de Restauração (Movimento Stone-Campbell) desde o final do século passado.


Cottrell nasceu em Kentucky e foi criado em Stamping Ground. Casou-se com sua esposa, Barbara, em 1958. Eles ministram na Igreja Cristã da cidade de Bright, no estado de Indiana, nos EUA, e vive na cidade de Lawrenceburg, Indiana. Eles têm três filhos e quatro netos.


Jack Cotrrell é professor de Teologia na Universidade Cristã de Cincinnati desde 1967 e autor de numerosos livros sobre a Doutrina e Teologia Cristã. Ele obteu um Bacharel em Artes (B.A.) da Universidade Cristã de Cincinnati em 1959. Em seguida, um Mestrado em Divindade (Mdiv) do Seminário Teológico de Westminster e o doutorado em Filosofia (PhD) do Seminário Teológico de Princeton.


Cottrell retornou à Universidade Cristã de Cincinnati em 1967 como professor de Bíblia e Teologia. Desde então, escreveu mais de 20 livros sobre Doutrina e Teologia Cristã. Os tópicos frequentes abordados por ele incluem a graça, fé, batismo, exatidão bíblica, bem como a natureza de Deus. Ele também já abordou questões como liderança e teologia feminista no Cristianismo. Cottrell tem adicionalmente escrito diversos comentários bíblicos.
As visões teológicas de Cottrell são semelhantes à opinião majoritária das Igrejas Cristãs / Igrejas de Cristo. Ele crê na inerrância da Bíblia. Ele também crê que o batismo por imersão é o momento no qual os pecados individuais são perdoados.


Devido à sua formação dentro dos círculos reformados, Jack Cottrell tem sido um crítico convicto do Calvinismo. Aliás, as Igrejas de Cristo / Cristãs, apesar de sua origem presbiteriana (em sua maioria) e batista, são arminianas desde o seu surgimento como uma comunhão cristã norte-americana.


Wayne Grudem, em sua Teologia Sistemática, faz uma resenha de várias obras de conteúdo teológico evangélico. Entre as obras citadas ele faz referência a três escritas por Cottrell, são elas:


What the Bible Says About God the Creator. Joplin, Mo.: College Press, 1983.
What the Bible Says About God the Ruler. Joplin, Mo.: College Press, 1984.
What the Bible Says About God the Redeemer. Joplin, Mo.: College Press, 1987.


Sobre Jack Cottrell ele ainda escreveu: “É um teólogo arminiano versátil e sério, professor do Cincinnati Bible Seminary, nos EUA (Igreja Cristã / Igrejas de Cristo).”


Há vários artigos publicados em português do nosso irmão Jack Cottrell. Se você se interessar em lê-los é só acessar: www.arminianismo.com .




Pedro Agostinho Jr.,
Pastor da Igreja de Cristo,




Fontes e referências:


www.arminianismo.com
http://en.wikipedia.org/wiki/Jack_Cottrell
www.ccuniversity.edu
jack.cottrell@CCUniversity.edu

O DNA das Igrejas de Cristo - 2




Unidade, Diversidade e Liberdade

Sabemos que o Movimento de Restauração surgiu oficialmente com a união das Igrejas Cristãs (Cristãos) e das Igrejas de Cristo (Discípulos de Cristo) em 1832. Os cristãos tinham como seu principal líder Barton W. Stone e os discípulos eram dirigidos por Thomas e Alexander Campbell.


Todavia, uma uniformidade doutrinária e prática nunca foi alcançada entre as igrejas do nosso Movimento. As igrejas eram muito diferentes uma das outras, mas eles buscaram e alcançaram a união. Tanto que Barton W. Stone comentou: “Eu considero essa união como o ato mais nobre de minha vida” (Humble, 20).


Semelhanças entre os pioneiros


“Campbellistas” e “stoneítas” eram semelhantes nos seguintes pontos:


A Bíblia e os credos ou confissões: A Bíblia era para eles a única autoridade em matéria de fé e prática cristã e concordavam que Credos ou Confissões de Fé não deviam ser impostos sobre a igreja;
Unidade cristã: Eles promoviam a unidade cristã;
Rejeição do calvinismo: Eles reagiram contra a teologia calvinista da Igreja Presbiteriana e passaram a aceitar as idéias da teologia reformada arminiana;
Rejeição do pedobatismo: Ambos aceitavam o batismo de crentes, rejeitando o batismo de crianças (pedobatismo);
Nomes bíblicos: Procuravam se designar por nomes bíblicos: “cristãos” ou “discípulos”, “Igrejas Cristãs” ou “Igrejas de Cristo”;
Governo congregacional: As igrejas eram congregacionais, ou seja, não aceitavam outras formas de governo além da igreja local.


Principais diferenças


Leroy Garrett, um dos grandes historiadores do nosso Movimento, também identificou algumas diferenças entre eles (Soto, 32):


Nome: os campbellistas usavam Igrejas de Cristo / Discípulos de Cristo. Os stoneístas Igrejas Cristãs / Cristãos;
Batismo: os campelistas enfatizavam o batismo para o perdão dos pecados. Os stoneístas a imersão de crentes, mas não necessariamente para o perdão dos pecados;
Ceia do Senhor: os campbellistas praticavam semanalmente (domingos). Os stoíneístas afirmavam que não há nenhum mandamento bíblico quanto à periodicidade da Ceia do Senhor;
Ministério cristão: os campbellistas não favoreciam um ministério ordenado. Os stoneístas criam que somente um ministério ordenado poderia batizar os novos convertidos, por exemplo;
Modelo de Unidade: os campbellistas estavam preocupados em restaurar um padrão ou modelo antigo para a igreja. Os stoneístas estavam mais interessados em unir todos os homens em Jesus Cristo;
Método evangelístico: os campbellistas, influenciados pela filosofia secular (o racionalismo e o realismo sensato) enfatizavam a razão ou no “linguajar evangélico” enfatizavam a Palavra. Os stoneístas usavam os métodos do Segundo Grande Avivamento, onde as reuniões de avivamento organizadas se tornaram o meio mais comum de evangelizar, com pregações emocionais e conversões com manifestações físicas e sinais.


O testemunho evangélico da época


Um dos maiores teólogos de todos os tempos, Augustus H. Strong, registrou em sua Teologia Sistemática, a obra mais usada entre os batistas há quase 200 anos, a enorme diversidade de opiniões entre nossas igrejas (Strong, 720). Todavia, o desejo de união foi maior do que suas diferenças.


Unidade na diversidade


Para Garrett o que caracteriza o nosso Movimento é a unidade na diversidade e até Alexander Campbell, o principal teólogo e organizador das Igrejas de Cristo no século XIX afirmou:


“Nós temos entre nós toda a sorte de doutrinas pregadas por toda a sorte de homens” (Haley, 3).


Era Alexander Campbell um mentiroso? Claro que não.


A declaração acima é verdadeira e fica provada, além das diferenças citadas acima, pelas razões que apresentaremos a seguir. Barton W. Stone teve enormes dificuldades para aceitar as formulações teológicas sobre a Trindade e foi simpatizante do ecumenismo. O próprio Campbell, já ancião, não ensinava e nem praticava a imersão com o propósito de perdoar os pecados, cria que havia cristãos nas denominações e etc. E Thomas Campbell permaneceu calvinista em suas convicções teológicas até ir para o Senhor (Garrett, Restauration Review). Quanto ao governo da igreja também havia diversidade. Os irmãos que tinham origem batista tinham um governo democrático. Os de origem presbiteriana eram favoráveis a um governo democrático representativo com um presbitério governando a igreja local (Haley, 4) e assim permaneceram.


Intolerância e Divisão


Infelizmente, mesmo tendo essa grande diversidade como herança, as igrejas do nosso Movimento enveredaram pela intolerância e a divisão. As diferenças entre o norte e o sul (Soto, 104) e a amargura decorrente da Guerra Civil nos Estados Unidos podem ser citados como aprofundadores das razões que causaram a divisão (para obter mais informações sobre esse assunto leia o artigo “As controvésias e as divisões no Movimento de Restauração”, no site www.movimentoderestauracao.com ou em nosso blog sobre a historia das Igrejas de Cristo: www.historiadasigrejasdecristo.blogspot.com ).


O nosso Movimento teria se transformado em uma seita que se reproduz por divisões legalistas se não fosse a intervenção de homens como Isaac Errett, autor do clássico “Nossa Posição – Uma sinopse da fé e da prática da Igreja de Cristo”, traduzido em português pelo autor desse artigo, e disponível nos sites acima citados.


Conclusão


Devemos rejeitar o sectarismo, valorizar a tolerância e buscar a unidade entre os cristãos. Esse foi o caminho percorrido pelos pioneiros do Movimento de Restauração/Movimento Stone-Campbell. Negar a destra da comunhão por causa de diferenças doutrinárias ou práticas é ir na contra-mão da nossa tradição de unidade, diversidade e liberdade. Lembrem-se dos nossos antigos lemas:


“No essencial, unidade; Nas opiniões, liberdade; Em todas as coisas, o amor”;


“Não somos os únicos cristãos, mas unicamente cristãos”.


Como Errett disse: "Que o laço de união entre os batizados seja o caráter cristão em vez da ortodoxia; o correto fazer em vez do correto pensar; e, ao tomar em conta os secos preceitos, que se reconheça a liberdade de cada um sem buscar impor limitações aos irmãos fora da imposição da lei do amor". Os nossos antepassados aprenderam essa lição e preservaram a unidade do espírito na paz de Cristo (Soto, 32).


Ao chegar em Brasília-DF pela primeira vez para a Atualização Ministerial e Eclesiástica (AME), constatei a enorme diversidade que caracteriza as Igrejas de Cristo do centro-oeste brasileiro. Fiquei apaixonado. Como se parecem com o nosso Movimento no início. Unidade, diversidade e liberdade, eis a nossa principal virtude. E esse é o caminho para nós no século XXI: a unidade na diversidade!




Pedro Agostinho Jr.
Pastor da Igreja de Cristo


Fontes:


HUMBLE, B. J. La Historia de La Restauración, pág. 20.
SOTO, Fernando. La Reforma Presente (citando “The Stone-Campbell Movement: Na Anecdotal History of Three Churches” de Leroy Garrett, 282), pág. 32.
STRONG, A. H. Teologia Sistemática, pág. 720.
HALEY, T. P. Unidade na Diversidade (Relatório Convenção Centennial, 1910 – ed. W. R. Warren), pág. 01.
GARRISON, J. H., Union Christian, pág. 37.
GARRETT, Leroy. Restoration Review, Vol. 20, No. 10, dezembro de 1978.

O DNA das Igrejas de Cristo - 1



O Batismo e a Ceia do Senhor

O batismo nas águas

Antes de tudo, é bom deixar bem claro que as igrejas oriundas do Movimento de Restauração nunca tiveram uma confissão de fé ou manual para regular a adoração. Por essa razão sempre existiu uma enorme diversidade de opiniões e práticas, inclusive sobre o batismo (Jimenez, 5). Este estudo está afinado com o que Isaac Errett em 1863 apresentou como a posição da Igreja de Cristo sobre o batismo nas águas.




Mas, o que é o batismo? O batismo é um mandamento perpétuo ordenado pelo Senhor Jesus (Mt 28:19), que ao ser batizado por João nos deixou o exemplo (Mt 3:5-6,13-17). A palavra grega transliterada para o português como batismo é “baptizo”. Se essa palavra fosse traduzida para o nosso idioma seria “mergulhar” ou “imergir”, pois é isso que ela significa. Se os escritores inspirados do Novo Testamento quisessem dizer “aspergir” usariam a palavra “rantizo” ou se quisessem falar “derramar” usariam o termo “ekqueo”. Portanto, no Novo Testamento, batismo é imersão. Isso fica evidenciado pelo que o batismo requer na Escritura:




1) Água (At 10:47; Mt 3:13);

2) Muita água (Jo 3:23);

3) Ir à água (Mt 3:5-6; At 8:36);

4) Entrar na água (At 8:38);

5) Sair da água (At 8:39; Mc 1:10).




Quem deve ser batizado? Quando? A Bíblia responde:




1) Os crentes em Jesus (Mc 16:16; At 18:8);

2) Arrependidos dos seus pecados (At 2:38);

3) Todos aqueles que ouviam e aceitavam a mensagem do Evangelho de Jesus Cristo eram batizados imediatamente e assim deve ser feito hoje (At 2:41; 8:12; 8:35-38; 9:9,17-18; 10:44-48; 16:14-15; 16:30-33).




Segundo a Bíblia, não há cristão sem ser batizado e não há nenhum exemplo de pessoas adiando o batismo. Observem também nesses textos as expressões “aceitaram”, “deram crédito”, “crês” e “ouvindo, criam”. Não existe nenhuma discussão quanto ao fato do batismo dos que creem em Cristo, mas quanto ao batismo de crianças (pedobatismo), que ainda não têm o discernimento para entender e crer há muita controvérsia. A imersão de crentes é universal, já o pedobatismo não. “Aceitamos, pois, a marca da universalidade e rejeitamos o que carece dela” (Errett, 7 e 8).




O que diz o Novo Testamento sobre o propósito do batismo nas águas? Confira as seguintes passagens que relacionam aceitar Jesus com fé, arrependimento dos pecados e batismo nas águas com a salvação:




1) Arrependam-se e recebam o batismo para a remissão dos pecados (At 2:38);

2) Recebe o batismo e lava os pecados (At 22:16);

3) Quem crer e for batizado será salvo (Mc 16:16);

4) Somos batizados em Cristo (Rm 6:1-6; Cl 2:12; Gl 3:26-27);

5) O batismo é uma condição para o recebimento do dom do Espírito Santo (At 2:38).




O irmão Isaac Errett escreveu:




“E quanto ao propósito do batismo, não vamos na companhia dos batistas; nós falamos mais conforme com o partido oposto, apesar de não poder dizer que nossa posição seja exatamente a mesma de nenhum dos que o formam. Dizem os batistas que batizam a seus adeptos por estar estes perdoados, insistindo com isto que devem ter a evidência do perdão antes de ser batizados. Tão claro e nada ambíguo é todavia a linguagem empregada pelas Escrituras para dizer qual é o objetivo do batismo que a maioria dos protestantes e também os católicos romanos reconhecem em seus credos que, em algum sentido, é para a remissão dos pecados, mas estes e muitos daqueles unem ao batismo a ideia da regeneração e insistem que naquele é efetivamente conferida esta pelo Espírito Santo. Até a célebre Confissão de Westminster parece favorecer a ideia, ainda que expliquem de outra maneira aos seus aderentes na atualidade. Estamos tão longe desse exagero ritualístico como do anti-ritualismo que os batistas têm se deixado levar. Entre nós, a regeneração deve ser realizada antes do batismo, quando menos o suficiente para que a pessoa possa estar mudada em seu coração, e haver rendido este a Cristo, movido pela fé e arrependimento, porque de outra maneira não passa o batismo de ser uma forma vazia. O perdão, porém, é distinto da regeneração – (destaque do tradutor). Aquele é ato Soberano; não é a mudança do coração, e sim um bem outorgado quando há fé e arrependimento, convém que o seja em uma forma tal que o pecador penitente tome posse da promessa de perdão dada pelo Senhor, confiando nos testemunhos divinos: "Quem crer e for batizado será salvo" e "Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para remissão dos vossos pecados e recebereis o dom do Espírito Santo". Desta maneira lança mão da promessa do Senhor, tomando posse dela. Não é que a mereça, procure nem ganhe com o batismo, mas que toma por seu o que a Divina Misericórdia do Senhor tem provido e oferecido segundo o Evangelho...




Ensinamos, pois, aos que se batizam que, ao trazer para o batismo um coração que renuncia ao pecado e confia absolutamente no poder que tem Jesus Cristo para salvar, podem descansar na promessa do mesmo Salvador, a saber, que "o que crer e for batizado será salvo” (Errett, 8 e 9).




Portanto, o batismo nas águas não é a regeneração ou o novo nascimento, que antecede o rito do batismo. Mas, é no batismo nas águas, precedido de arrependimento e fé, que encontramos a evidência ou certeza do perdão.




Estão perdidos os que não foram batizados por imersão e com o propósito correto? Nesse ponto devemos ter a mesma atitude de Alexander Campbell, maduro e muito mais experiente, que em resposta a uma carta (A Carta de Lunenberg) disse:




"O que deduz que só é cristão aquele que tenha sido submergido está em tão grave erro como aquele que afirma que ninguém está vivo, senão os que tem uma visão clara e completa... Eu pecaria contra as minhas próprias convicções se ensinasse que alguém por não haver entendido o significado de um sacramento (instituição), ainda que sua alma anele conhecer por completo a vontade de Deus, deva perecer eternamente” (Soto, 79).




As Igrejas de Cristo batizam por imersão nas águas os crentes, a partir da idade de responsabilidade moral, que tenham confessado publicamente a Cristo como seu Senhor e Salvador pessoal, em cumprimento da ordem do Senhor Jesus. Ele é um símbolo da nova vida em Cristo e representa a união com Jesus na sua vida, morte e ressurreição. Dessa forma, concluímos que o batismo não é meramente um símbolo (a posição batista) nem é a regeneração ou novo nascimento (a posição católica), mas é parte da resposta do homem ao chamado de Deus para a salvação e nele, como já foi dito, temos a confortável evidência do perdão: “Quem crer e for batizado será salvo” (Mc 16:16).




A Ceia do Senhor




A Ceia do Senhor é um rito contínuo da Igreja, foi estabelecida por Cristo na sua última páscoa com os discípulos (Mt 26:17-29; Mc 14:12-26; Lc 22:19) e em comparação com essa festa judaica é muito mais simples (Dt 16:1-12). A Ceia do Senhor é chamada:




1) Partir o pão (At 2:42; 20:7);

2) Mesa do Senhor (1Co 10:21);

3) Ceia do Senhor, porque Ele a instituiu (1Co 11:20);

4) Comunhão (1Co 10:16-17).




Quanto ao seu significado, a Ceia do Senhor é:




1) Uma recordação da morte de Cristo (1Co 11:24; 15:3);

2) Uma proclamação:

a) Da morte do Senhor (1Co 11:26; Lc 22:20);

b) Da Sua volta (1Co 11:26);

3) Um símbolo da unidade dos cristãos (1Co 10:17).




E os elementos usados na Ceia do Senhor são:




1) Pão. Durante a páscoa judaica, ocasião da instituição da Ceia do Senhor, o pão que era comido naquela semana pelos judeus era sem fermento ou ázimo. Todavia, afirmar com base nisso que o pão da Ceia do Senhor hoje deve ser sem fermento é equivocado sob o ponto de vista da hermenêutica. A Ceia do Senhor não é a páscoa judaica. O Novo Testamento não descreve que tipo de pão deve ser usado;

2) Suco da Videira. Se este suco de uva era fermentado (vinho) ou não tem sido motivo de grande polêmica desde os primórdios do cristianismo. Porém, sendo o contexto geral da Bíblia contrário à embriaguez, o contexto cultural brasileiro entender que o crente verdadeiro não usa bebidas alcoólicas e por ser o alcoolismo uma das maiores mazelas da nossa sociedade, substituímos o vinho na Ceia do Senhor pelo suco de uva.




Quando devemos celebrar a Ceia do Senhor? Não há por todo o Novo Testamento nenhuma especificação sobre o tempo e a freqüência da Ceia do Senhor. A única ordem que temos, dada pelo próprio Senhor Jesus, é para fazê-la em memória dele (Lc 22:19). Isaac Errett, ao falar sobre a Ceia do Senhor na Igreja de Cristo, afirma:




“Entre nós também ocupa a Ceia do Senhor um lugar distinto do que comumente se lhe designam. Não a revestimos com o caráter imponente de um sacramento, senão que a vemos como uma festa desejosa e preciosa de santa comemoração, cujo desígnio é o de avivar nosso amor para com Cristo e cimentar nossa comum fraternidade. Por esta razão fazemos de sua observância uma parte de nosso culto regular, cada dia do Senhor, tendo ela por festa de amor solene mas gozosa e refrescante, se unir à qual todo discípulo de nosso Senhor deveria ter por um grande privilégio. "Consagrada à memória de nosso Senhor Salvador Jesus Cristo"; eis aqui o inscrito nesta festa de família simples e solene celebrada na casa do Senhor” (Errett, 6 e 7).




O irmão Pablo Jimenez afirma que entre nós há a tradição de celebrar a Ceia do Senhor todo domingo “como o evento central da adoração congregacional” e que “os fundadores de nossa igreja “tomaram como base os ensinos de 1Coríntios 11:23-26 e a tradição da Igreja Primitiva (At 2:42,46; 20:7) para afirmar que a Bíblia nos ordena celebrar a ceia semanalmente em memória de Jesus” (Jimenez, 3). Grudem disse que “se a Ceia do Senhor for planejada e praticada para ser um momento de auto-exame, de confissão, de ação de graças e de louvor, não me parece que celebrá-la uma vez por semana seja exagero, e certamente ela pode ser celebrada com tal freqüência ‘para a edificação’” (Grudem, 844). Justino Mártir, discípulo de Policarpo que foi discípulo do Apóstolo João escreveu em cerca de 150 d.C.:




“E no dia chamado domingo os que viviam nas cidades ou fora delas se reúnem em um lugar onde lêem as memórias dos apóstolos ou os escritos dos profetas, tanto como o tempo o permita. Então, quando for terminada a leitura, o presidente instrui oralmente e exorta à imitação das boas obras; depois nos levantamos todos, oramos e, como dissemos antes, terminada a nossa oração, se traz o pão, vinho e água; e o presidente oferece orações e ações de graças e o povo responde dizendo: amém. Em seguida se distribui a cada um e participam disso todos os que deram graças. Aos ausentes se lhes envia uma parte com os diáconos” (Sizemore, 47).




O irmão Denver Sizemore ainda diz que é evidente que a Igreja Primitiva celebrou a Ceia do Senhor semanalmente por cerca de 200 anos e a Igreja Grega a praticou por 700 anos de tal maneira que aquele não participava por três semanas consecutivas era excomungado (Sizemore, 47 e 48). As igrejas com origem no Movimento Stone-Campbell, imitando a Igreja Primitiva, têm como uma das suas características distintivas a celebração semanal (aos domingos) da Ceia do Senhor.







Pedro Agostinho Jr.,

Pastor da Igreja de Cristo




Fontes:




ERRETT, Isaac. Nossa Posição: uma sinopse da fé e da prática da Igreja de Cristo, disponível na internet no site www.movimentoderestauracao.com .

SOTO, Fernando. La Reforma Presente (citando “Memoirs of Alexander Campbell”, de Robert Richardson).

JIMENEZ, Pablo A. La Cena del Señor en la Iglesia Cristiana (Discípulos de Cristo), disponível na internet no site www.disciples.org .

GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. Vida Nova.

SIZEMORE, Denver. Lecciones de Doctrina Bíblica, volumen I, American Rehabilitation Ministries and The American Bible Academy, Joplin, Missouri (citando “Los Padres Apostólicos con Justino Martir y Irenaeus” de A. Cleveland Moxe, pág. 185 e 186).

Avivamento e o Movimento de Restauração




"Temos que ter todo o cuidado nestas questões. O que sabemos acerca da esfera de ação do Espírito? O que sabemos acerca do Espírito cair em pessoas? O que sabemos sobre estas grandes manifestações do Espírito Santo? Precisamos ser cautelosos, 'para que não sejamos achados lutando contra Deus', para não sermos culpados de 'apagarmos o Espírito de Deus' (Martyn Lloyd-Jones)".






Introdução
É do nosso conhecimento que nos EUA, Brasil, Chile, Porto Rico e em outros países latino-americanos muitas igrejas com origem no Movimento de Restauração (ou Movimento Stone-Campbell), e dos três principais ramos dele (os liberais-ecumênicos Discípulos de Cristo, os radicais Anti-Instrumentais e os centristas Independentes), têm experimentado uma renovação espiritual, e não é de hoje que isso vem acontecendo.


Estes irmãos e igrejas têm sido influenciados pelo movimento chamado pentecostal-carismático do século XX. É impossível não perceber esse movimento, especialmente por causa do seu grande crescimento. As maiores igrejas evangélicas do mundo e as maiores denominações cristãs brasileiras são pentecostais ou carismáticas. Este movimento tem nos chamado para uma renovação espiritual, um testemunho mundial do Evangelho e uma grande colheita final. Além de não passar mais despercebido, essa obra renovadora do Espírito Santo em nossos dias parece indicar que "Deus derramou, em todos os lugares, o Espírito Santo sobre os cristãos que buscam ter uma vida cheia do Espírito, caracterizada pela santidade e pelo poder espiritual".1


Como conseqüência, não são poucos os irmãos que compartilham a nossa origem comum que, lamentavelmente, negam a destra da comunhão aos irmãos "renovados". Cremos, sinceramente, que uma das razões para esta atitude é o esquecimento do fato que o Movimento de Restauração tem uma marcante herança avivalista do período da história da Igreja conhecido como o "Segundo Grande Avivamento".


Ao escrevermos este artigo temos o humilde propósito de mostrar que o Movimento de Restauração começou no Grande Avivamento em Cane Ridge em 1801 e assim contribuir para a desmitificação da falsa idéia de incompatibilidade entre avivamento e restauração. Que Deus nos ajude.


1. O Que É Avivamento


"Despertamento", "reavivamento" e "avivamento" parece que são palavras que definem uma mesma experiência: um movimento do Espírito Santo. No Brasil, o termo mais usado é avivamento e é ele que usaremos neste artigo.


Para Arthur Wallis um avivamento "é o Senhor desnudando o seu braço e operando com extraordinário poder sobre santos e pecadores". Para Martin Lloyd-Jones havia "uma experiência sobrenatural do Espírito, uma unção, uma dotação de poder, muitas vezes podendo ser repetida, destinada para toda a igreja, dramática, experimental, observável, e somente indiretamente relacionada com a santificação". Para o Dr. John White "o que temos chamado de avivamento pelos últimos trezentos anos representa um trabalho incomum do Espírito Santo, com as seguintes características:


1. Homens, mulheres e crianças, convertidas e não-convertidas, tomados por uma visão, tanto da santidade de Deus como da sua misericórdia, são despertados em grande número, para a fé e a adoração;
2. O poder de Deus é manifestado em vidas humanas de forma que as leis da psicologia e da sociologia não conseguem explicar adequadamente;
3. A comunidade como um todo torna-se consciente do que está acontecendo, muitos entendendo o movimento como uma ameaça a instituições existentes;
4. Alguns homens e mulheres exibem comportamentos físicos e emocionais fora do comum, que criam controvérsia, e que podem tornar-se ofensivos para os que se opõem ao avivamento e uma armadilha para os que o apoiam;
5. Alguns crentes avivados comportam-se de maneira impulsiva e imatura, e outros caem em pecado. Dessa forma o avivamento parece uma mistura de influências de Deus com as que não vêm de Deus, e de exibições do poder de Deus e da fraqueza humana;
6. Onde quer que o avivamento atinja proporções suficientes para causar um impacto nacional, reformas socio-políticas são perpetradas no século seguinte. Dessa forma o reino de Cristo começa a ser exercitado sobre males da opressão e injustiça."2


Nos períodos de avivamento na história da Igreja as manifestações físicas geralmente estão presentes e vêm de forma inesperada e sem explicação. Foi assim nos tempos de John Wesley, Jonathan Edwards, James McGready, Barton W. Stone, na Rua Azusa e até os dias de hoje. A Bíblia mesmo diz que o Espírito Santo produz manifestações físicas nos santos na presença do Senhor como tremores (Jr 5:22; Is 66:2; Ed 9:4), choro (Ne 8:9), arrepios (Sl 119:120), arrebatamento dos sentidos (At 22:17-21), um estado parecido com a embriaguez (1Sm 1:12-17; 19:23-24). E, além disso, a ação do Espírito Santo na expulsão dos espíritos malignos causa gemidos, convulsões, inconsciência (Mc 1:23-28; 9:14-29) e outras manifestações físicas.3


Ao avaliarmos a origem do Movimento de Restauração, o Grande Avivamento em Cane Ridge, assim como outros avivamentos não devemos esquecer as palavras de Jesus no Evangelho de Mateus 7:16-20, onde está escrito:


"Vocês os reconhecerão pelos seus frutos. Pode alguém colher uvas de um espinheiro ou figos de ervas daninhas? Semelhantemente, toda árvore boa dá bons frutos, mas a árvore ruim dá frutos ruins. A árvore boa não pode dar frutos ruins, nem a árvore ruim pode dar frutos bons. Toda árvore que não produz bons frutos é cortada e lançada ao fogo. Assim, pelos frutos vocês os conhecerão!".


2. Avivamento na Fronteira Oeste dos EUA no Século XIX


Entre o final do século XVIII e início do século XIX teve início nos EUA o período da história da Igreja conhecido como o "Segundo Grande Avivamento". Os nomes mais destacados desse período são o congregacional Timothy Dwight, o grande evangelista Charles Finney (1792-1875), e os presbiterianos James McGready e o nosso amado irmão Barton W. Stone, pioneiro do Movimento de Restauração.


Entre os habitantes da fronteira oeste dos EUA a embriaguez, o jogo, a prostituição, a criminalidade, a linguagem vulgar, o adultério, toda sorte de imoralidades e uma enorme falta de interesse nas coisas de Deus caracterizavam os desbravadores daquela região. O cinema retratou artisticamente muito bem essa realidade. Em 1800 a população do Estado do Kentucky, que tinha saltado em oito anos de setenta e cinco mil para duzentos e vinte mil habitantes, somente cerca de onze mil pessoas faziam parte de alguma igreja.


Neste mesmo Estado e ano aconteceu um avivamento quando James McGready, pastor presbiteriano, começou a promover reuniões de oração. Ele pastoreava três pequenas congregações no sudoeste do Estado: Muddy River, Gasper River e Red River. Em junho, aproximadamente quinhentos membros destas três igrejas estavam reunidos em Red River. No último dia daquele encontro um grande derramamento do Espírito veio sobre o povo e as primeiras manifestações do poder de Deus tiveram início. Um mês depois, no final de julho, McGready e outros realizaram uma "Reunião de Acampamento" em Gasper River. Estiveram presentes mais de oito mil pessoas, entre elas estava Barton W. Stone que testemunha:


“Ao chegar, encontrei a multidão reunida na beira de um prado onde continuou acampada durante muitos dias e noites consecutivos, durante os quais havia a todo o momento adoração a Deus em algum lugar do acampamento. Muitas vezes havia pregação em vários pontos simultaneamente".4


Segundo o próprio McGready, durante uma pregação vibrante de um pastor presbiteriano, o poder de Deus parecia agitar toda a assembléia".5 Confira o que Barton W. Stone disse sobre isto: .


"As cenas eram para mim de sobremodo estranhas. Desafiavam quaisquer tentativas de descrevê-las. Grandes números de pessoas caíam como mortos na guerra, e continuavam por horas num estado relativamente imóvel e sem respiração. As vezes, por alguns momentos, reavivavam e demonstravam sintomas de vida por um profundo gemido ou grito agudo e penetrante, ou ainda por uma oração por misericórdia fervorosamente pronunciada. Depois de permanecer assim por horas, obtinham a libertação. A nuvem tenebrosa que cobrira seus rostos parecia desvanecer progressivamente e visivelmente, e a esperança em sorrisos clareava até se transformar em alegria. Levantavam-se, então, para bradar sua libertação, e dirigiam-se à multidão em redor numa linguagem eloqüente e impressionante. Atônito, eu ouvia mulheres e crianças declarando as maravilhosas obras de Deus e os gloriosos mistérios do Evangelho. Seus apelos eram solenes, comoventes, ousados e livres. Sob efeito de tais apelos muitos outros caíam no mesmo estado do qual estes acabaram de ser libertos".6


Ouvir ou ler um testemunho de alguém desconhecido pode não ser muito convincente. Porém, o testemunho de Barton W. Stone, um dos grandes pioneiros do Movimento de Restauração é outra coisa. Para mim é muito mais confiável. Que o testemunho de Barton W. Stone é por si só de grande relevância, o que diremos quando este descreve o que aconteceu com seus próprios conhecidos pessoais? Eu tenho a tendência em confiar ainda mais no relato dos fatos. Então vejamos o que ele disse:


"Dois ou três dos meus conhecidos pessoais foram também prostrados. Sentei-me com paciência perto de um deles (que eu sabia ser um pecador desleixado) por várias horas, observando com atenção tudo que passou do início ao fim. Observei os despertamentos momentâneos, como se fosse da morte, a humilde confissão, a oração fervorosa e a libertação final; depois as solenes ações de graça e louvor a Deus, a afetuosa exortação aos companheiros e ao povo em redor para se arrependerem e virem a Jesus. Fiquei atônito ao ver o conhecimento da verdade do Evangelho manifesto nessas exortações. Como resultado muitos caíram a semelhança da morte.7


O que podemos dizer diante de tudo isso. Estas coisas que aconteceram vieram de Deus? O que você pensa a respeito? A minha opinião importa para você? E a de Barton W. Stone, você consideraria? Então leia, mais uma vez, suas palavras:


"Depois de observar vários casos, tive convicção de que era uma boa obra, e desde então minha mente nunca vacilou sobre este ponto”.8


Para ele tudo isso era uma boa obra! E nunca mais ele duvidou disso.


O avivamento espalhou como fogo por toda a fronteira oeste norte-americana. As "Reuniões de Acampamento" organizadas se tornaram o meio mais comum de evangelizar e as conversões eram dramáticas e marcadas por manifestações físicas. As principais conseqüências desse avivamento foram:


1. Uma maior preocupação com as coisas espirituais e proporcionou uma renovação da vitalidade nas igrejas;
2. Crescimento extraordinário das principais igrejas cristãs através das "Reuniões de Acampamento";
3. Maior compromisso missionário;
A busca por reformas sociais (abolicionismo, direitos das mulheres, condições de trabalho);
4. Novos métodos de evangelismo associados às "Reuniões de Acampamento", apelos, testemunhos e etc.;
5. Distinções denominacionais diminuídas ou eliminadas durante as Reuniões de Acampamento, pois crentes de várias correntes teológicas e igrejas colaboraram durante o avivamento;
6. O surgimento de movimentos que buscavam restaurar o cristianismo do primeiro século - o Movimento de Restauração;
7. Por fim, devido à intolerância, os crentes avivados acabaram sendo expulsos das suas denominações, fazendo surgir novos grupos.


3. O Grande Avivamento em Cane Ridge (Kentucky)


Em Cane Ridge, no ano de 1801, aconteceu a maior Reunião de Acampamento daquele período, com a presença de cerca de trinta mil pessoas, segundo o que o próprio Barton W. Stone ouvira de alguns militares.


Para compreender a grandeza deste evento é bom saber que a maior cidade do Kentucky tinha apenas dois mil habitantes! Fernando Soto, em seu livro "A Reforma Presente" escreveu:


"A Cane Ridge chegaram o Governador do Estado, prostitutas, anglo e afro-americanos, embusteiros, ladrões e também cristãos devotos certamente. Permaneceram ali vários dias até que por razões de abastecimento de alimentos e por higiene, tiveram que ordenar à multidão o regresso para suas casas".9


O Dr. John White registrou a descrição que Charles A. Johnson, um crítico, nos dá do tipo de pessoas que veio à Cane Ridge:


"Alcoólatras traziam consigo a sua bebida, e a embriaguez e a promiscuidade não eram incomuns. Uma rapariga de vida fácil instalara-se debaixo de uma das plataformas de pregação, até que foi descoberta com seus companheiros masculinos".10


E ele ainda diz:


"Muito provavelmente esse tenha sido o evento mais desordenado, o mais histérico, e o maior de todos dentre os esforços despendidos na América em seus primórdios".11


No entanto, esse acampamento durou seis dias e foi marcado por conversões dramáticas, manifestações físicas e sinais, assim como no Novo Testamento e nos grandes períodos de avivamento na história da Igreja. Os presentes responderam às pregações com confissões, orações fervorosas, ações de graça, louvor a Deus, libertação, testemunhos, exortações ao arrependimento dos pecados e fé em Jesus como Senhor e Salvador. Barton W. Stone descreveu essas manifestações espirituais da seguinte maneira:


“As agitações corporais ou exercícios ocorridos no avivamento do início do século (1801) eram variadas e chamadas de diferentes formas: as quedas, os tremores, as danças, os latidos,12 as risadas e os cantos. A dança geralmente começava com tremores e era peculiar aos que professavam a religião.13 A pessoa, depois de tremer um pouco, começava a dançar e os tremores cessavam. Tal dança era em realidade celestial aos olhos dos espectadores. Não havia nela nada leviano nem nada que produzisse deliberadamente leviandade nos que olhavam. O riso do céu resplandecia no rosto do sujeito e a pessoa toda tinha uma aparência angelical. As vezes os movimentos eram rápidos, outras vezes lento... até que se sentiam exaustos e caiam prostrados ao chão a menos que fossem agarrados pelos presentes. Enquanto isso ocorria eu ouvia seus solenes louvores e orações subindo a Deus.”14


Dentre todas as expressões físicas a mais comum foi "cair". Cerca de três mil pessoas foram prostradas ao chão na Reunião de Acampamento em Cane Ridge. Os relatos afirmam que alguns desmaiaram e ficaram como mortos, porém outros permaneceram conscientes, mas não tinham forças para se mover. Uma outra experiência que Barton W. Stone chamou de "tremores" foi muito comum. Alguns que vieram para criticar ou ridicularizar foram subitamente surpreendidos com este fenômeno.15 Dia e noite, cerca de quarenta pastores presbiterianos, batistas e metodistas se revezavam nos diversos pontos de pregação instalados na área do acampamento. Havia sempre de um a sete pregadores simultaneamente. Por vezes, milhares de pessoas saiam gritando em voz alta, todos de uma vez. O som era estrondoso.


Uma outra experiência marcante em Cane Ridge foi "o exercício de cantar" que Fernando Soto define como algo semelhante ao que os carismáticos hoje chamam "cantar no Espírito". Sobre ele Barton W. Stone disse o seguinte:


"Entre tudo o que vi isto é o mais difícil de descrever. O sujeito, em um estado mental muito feliz, cantava da forma mais melodiosa jamais ouvida, não desde a boca ou nariz, mas inteiramente do peito, de onde mais vinham os sons. Tal música silenciava tudo o mais e atraía a atenção de todos. Era o mais celestial, ninguém poderia se cansar de ouvi-lo".16


James B. Finley, "que então era um livre pensador em matéria de religião, não estando ligado a nenhuma confissão" descreveu o avivamento em Cane Ridge nestas palavras:


"O barulho soava como o ruído das quedas do Niágara. O vasto mar de seres humanos parecia agitar-se como por uma tempestade... Algumas pessoas cantavam, outras oravam, outras clamavam por misericórdia com voz mais piedosa, e outros gritavam estrondosamente."17


Na continuação do seu relato observe como o autor descreve uma experiência sobrenatural pessoal:


"Enquanto eu observava tudo isso, uma sensação particularmente estranha, como eu nunca tinha sentido antes, veio sobre mim. O meu coração passou a bater fortemente, os meus joelhos trepidavam, os meus lábios tremiam, e eu me senti como se eu tivesse que cair ao solo. Um estranho e sobrenatural poder parecia impregnar a mente de todas pessoas lá reunidas... Um pouco depois eu me levantei e fui até a mata ao lado, e lá procurei reanimar-me e restabelecer a minha disposição".18


E para finalizar o registro do testemunho de James B. Finley, veja o quanto ele ficou "assustado até a morte" pelo Espírito Santo:


"Depois de algum tempo voltei ao local da excitação, cujas ondas, se possível, teriam atingido níveis mais altos ainda. O mesmo sentimento atemorizante veio sobre mim. Subi num toro, onde podia ter uma melhor visão do mar humano que se agitava ao meu redor. A cena que então se apresentou à minha mente é indiscritível. De uma vez eu vi pelo menos umas quinhentas pessoas sendo arrojadas ao solo como se uma bateria de milhares de armas tivesse sido descarregada sobre eles, e então seguiram-se gritos agudos e berros que rasgaram o próprio céu... Eu fugi de novo para a mata, e pensei que teria sido melhor se eu tivesse ficado em casa".19


O Dr. John White chama esta reação de Finley de interessante e argumenta que o fato dele ter ido a Cane Ridge como um "livre-pensador" lhe deu uma boa proteção contra qualquer manipulação ou efeito da psicologia das multidões.


As notícias sobre a Reunião de Acampamento em Cane Ridge espalharam por todo o Kentucky, Tennessee e outros Estados. A Igreja Presbiteriana, mais precisamente o Sínodo do Kentucky, desaprovou e reagiu com muita firmeza forçando Barton Stone, Robert Marshall, John Dunlavy, John Thompson, David Purviance e Richard McNemar, o primeiro a ser acusado de heresia ao ser chamado de “arminiano”, a deixarem a igreja. Eles formaram o Presbitério Independente de Springfield, que abrangia quinze igrejas, oito no norte do Kentucky e sete no sudoeste do Ohio.


Eles rejeitaram a Confissão de Fé de Westminster (calvinista), adotaram posições nitidamente arminianas, deixaram a Igreja Presbiteriana, passaram aceitar apenas a Bíblia como a sua única regra de fé e prática e, ainda, passaram a usar somente o nome de "cristão".20 No dia 28 de junho de 1804, o Presbitério de Springfield foi dissolvido por eles dando continuidade à restauração do cristianismo primitivo em uma só igreja. Em 1820 eles se unificaram com os "cristãos" (ex- metodistas republicanos) liderados por James O'Kelly e em 1832 com os "Discípulos de Cristo" dirigidos por Alexander Campbell.


Embora em Cane Ridge se tenha experimentado um legítimo avivamento, não podemos dizer que ele foi de natureza pentecostal, pelo menos como essa palavra é entendida hoje.


4. A Opinião de Barton W. Stone Sobre o Avivamento em Cane Ridge 30 Anos Depois


Barton W. Stone e Alexander Campbell são os personagens mais proeminentes do Movimento de Restauração. Isso fica evidente no fato do nosso movimento ser mais conhecido hoje, no século XXI, como Movimento Stone-Campbell.


Por ocasião da união dos seus respectivos grupos, é importante registrar que os "cristãos" de Barton W. Stone era muito maior do que os "discípulos" de Alexander Campbell. Por volta de 1820, as igrejas do movimento de Barton W. Stone somavam dez mil membros só em Kentucky, cinco mil membros em Ohio e outros tantos espalhados pelos Estados do Tennesee, Alabama, Indiana, Illinois e Missoury, somando cerca de vinte mil fiéis. Sobre os seus primeiros anos, os autores do livro “Raízes da Restauração” escreveram o seguinte:


“No início se concentrou na vida em santidade, buscando restaurar o estilo de vida da Igreja Bíblica. O ideal de liberdade era a pedra fundamental desse movimento e até o batismo era deixado a critério de cada um. O caráter cristão e a liberdade eram muito preciosos. Para eles a restauração da Igreja do Novo Testamento passava pela negação das tradições opressoras das igrejas estabelecidas e a unidade da Igreja Primitiva era a unidade na liberdade e não unidade na concordância”.21


Pois bem, Barton W. Stone em 1831 escreveu e publicou no "Christian Messenger" (Mensageiro Cristão) um artigo com o título "Revival of Religion" (Renovação da Religião). Neste artigo o pioneiro do Movimento de Restauração recorda e comenta sobre os eventos em Cane Ridge trinta anos depois. Sobre a oposição ao avivamento em Cane Ridge, naqueles dias e posteriormente, ele escreveu:


"Filósofos, dogmáticos e legalistas, que foram para medir a fé de acordo com a sua própria regra, foram geralmente opositores desta renovação. Sua oposição pareceu presságios do mal... O grande entrave a esta renovação foi o espírito do sectarismo, que inquieto como um demônio, infectou e destruiu o glorioso trabalho... Eles são tão opostos como trevas e luz, como fogo e água".22


Barton W. Stone continua perguntando:


"Devemos nos opor às renovações porque descobrimos nelas muitas emoções, desordem e meios não-escriturais utilizados por aqueles que trabalham nelas?... Porque pensamos que os seus condutores são ignorantes e não sabem o que é mais importante na doutrina do Evangelho?... O fogo da devoção não pode ser confinado... e os seus esforços nas famílias, bairros e congregações são poderosos em destruir o reino das trevas".23


Ao recordar, neste artigo, o deslocamento das multidões para Cane Ridge, Barton W. Stone diz que elas vinham vestidas solenemente, que muitos molhavam os seus caminhos com lágrimas e que outros vinham louvando a Deus em alta voz. Ele também diz que em Cane Ridge houve imperfeições, excentricidades ou aberrações. Mas, imediatamente, ele reconhece que não podia encontrar a perfeição em uma multidão de imperfeitos, pois eram homens.


Sobre os resultados do Grande Avivamento em Cane Ridge, Barton W. Stone testemunha:


"Vi a religião de Jesus exposta mais claramente na vida dos cristãos como nunca eu tinha visto antes ou na mesma medida. Vi que os pregadores foram reavivados, preenchidos com o Espírito Santo de Deus, abordando as multidões não no estilo "iceberg", nem de acordo com as regras de retórica e estudos de oratória, mas na língua e no espírito do céu... Eles não consideraram a censura, nem os discursos duros dos opositores que os chamavam de emocionais e os representavam como loucos... Através de muitas dificuldades, públicas e privadas, eles trabalhavam dia e noite de casa em casa, bairro a bairro, pregando a palavra da salvação para todos".24


Ainda falando sobre os resultados do avivamento, Barton W. Stone neste artigo diz que viu congregações reavivadas, viu pecadores independente de idade, sexo e condição social chorando, orando e se convertendo a Deus. Ele também afirma que viu inimigos se tornando amigos e o fruto do Espírito crescendo abundantemente entre os santos de Deus. Quanto à Bíblia, ele diz que ela foi lida com um intenso desejo de encontrar a verdade. "A isto eu chamaria de renovação e obra de Deus", diz ele (cf. Mt 7:16-20).


5. As Posições Avivalistas de Barton W. Stone Não Foram um Impedimento à União


Fernando Soto diz que Barton W. Stone conheceu Alexander Campbell em setembro de 1824, ficaram amigos e por longos anos trocaram cartas. Em 1832 os "cristãos" (stoneístas) e os "discípulos" (campbellistas) se uniram. Sobre as diferenças entre os dois grupos, o autor citado escreveu o seguinte:


"Os cristãos da fronteira empregavam táticas de avivamento para propagar a fé. Tinham, em seus templos, 'a cadeira do penitente afligido' onde as pessoas oravam com lágrimas até sentir algo que confirmasse uma resposta de Deus. Neste sentido os discípulos do norte eram mais frios".25


Por tudo que já vimos acima, não há dúvidas que o Movimento liderado por Barton W. Stone empregava os métodos que caracterizaram o Segundo Grande Avivamento: realização de Reuniões de Acampamento avivadas, com pregações emocionais e conversões com manifestações físicas e sinais. E continuou utilizando estes métodos mesmo depois da união com os "campbellistas".


Todavia, o grupo liderado por Alexander Campbell era influenciado pela filosofia secular (o “racionalismo” e o “realismo sensato”) e enfatizava a “razão” ou no “linguajar evangélico” enfatizavam "a Palavra". Trazendo para o nosso tempo, os primeiros eram "carismáticos ou renovados" e os outros eram "tradicionais". No entanto, as posições avivalistas de Barton W. Stone e dos "cristãos do Kentucky" não serviram de pretexto ou impedimento à união dos pioneiros do Movimento de Restauração.


Então, por qual razão alguns dos modernos herdeiros de Stone e Campbell se recusam a ter comunhão com seus irmãos "avivados"? Será que com o passar dos anos os irmãos esqueceram os fatos acima citados? Por que será que nos EUA, hoje, as igrejas do nosso Movimento são compostas por um povo que é, em sua grande maioria, conhecido pela reação negativa às experiências com o Espírito Santo? Por que muitos irmãos querem repetir no século XXI as mesmas atitudes sectárias, rejeitadas tanto por Barton W. Stone como por Alexander Campbell e outros grandes pioneiros do Movimento de Restauração no século XIX? Ou seja, querer impor a uniformidade doutrinária como uma condição para a comunhão e a união cristã? Por fim, Fernando Soto sabiamente pergunta: "Que aplicação poderíamos fazer da história das Igrejas de Cristo hoje?"26 Reflita sobre tudo isso.


5. A Igreja de Cristo no Brasil e o Avivamento Carismático dos Anos 1960 - 1970


O Movimento de Restauração teve o seu primeiro esforço missionário bem-sucedido no Brasil com a chegada do Pr. David Sanders e sua esposa D. Ruth em 1948 (Christian Church / Church of Christ). No ano seguinte eles estabeleceram a primeira Igreja de Cristo no Brasil, no bairro de Vila Nova, em Goiânia, Estado de Goiás. Aos Sanders se juntaram J. Richard Ewing, Carolee Ewing, Ruth Spurgean e Ellen Case logo nos primeiros anos.


Em dezembro de 1953 o missionário David Sanders se encontrou com pastores e líderes da Igreja do Nosso Senhor Jesus Cristo, um movimento restauracionista brasileiro que já existia há 25 anos e contava com 13 igrejas locais em cinco Estados. Com a conclusão de que no essencial havia unidade, enquanto nas opiniões havia diferenças, a união foi aprovada dando à reunião o seu clímax. Então, Antônio dos Santos, presidente da Conferência de Ministros da Igreja do Nosso Senhor Jesus Cristo, deu a mão da comunhão ao missionário David Sanders unindo com o Movimento de Restauração estas igrejas. Registro isto para deixar claro a postura unionista do nosso Movimento no Brasil e como um testemunho em favor da unidade cristã. "No Essencial, Unidade; Nas Opiniões, Liberdade; Em Todas as Coisas, o Amor", este é o mais antigo lema do Movimento de Restauração.


Nas décadas de 1960 e 1970 outras famílias de missionários norte-americanos chegaram ao norte do país e trabalhos foram estabelecidos nos Estados do Pará, Amazonas, Amapá e no atual Tocantins. Nesta mesma época Arthur Carter estabelece-se em Belo Horizonte - MG, Eugene Smith em São Paulo - SP, Gerald Holmquist em Anápolis - GO e Dale H. McAfee em Ceres - GO. No Distrito Federal, David Sanders recebeu o lote 001 para igrejas no Plano Piloto em Brasília (EQS 305/306, Asa Sul), Bill Loft estabelece-se em Taguatinga - DF e Bill Metz no Gama - DF.27


Paralelamente, uma primeira safra de líderes brasileiros começou a surgir no fim da década de 1950, a segunda geração na década seguinte e a terceira geração surgiu entre os anos de 1964 e 1984. A esta terceira geração coube a imensa responsabilidade de assumir a liderança nacional das Igrejas de Cristo. Para o Pr. Ozório Gonçalves este fato é um divisor de águas na história da Igreja de Cristo no Brasil.


No artigo "O Movimento de Restauração no Brasil", o Pr. Merlyn Lee Shields descreve um outro fato que é muito marcante. Confira suas palavras:


"O final dos anos 60 foi também um período de reorganização espiritual para alguns missionários das Igrejas de Cristo. O movimento carismático estava varrendo várias denominações tradicionais. Três missionários das Igrejas de Cristo foram independentemente influenciados por alguns ensinamentos deste movimento e começaram a ensinar e a pregar a doutrina do batismo do Espírito Santo, sendo expresso por diferentes sinais, especialmente o dom de falar em línguas. Um total de cinco missionários, uma hora ou outra, ensinavam esta doutrina".28


O avivamento promovido pela Renovação Carismática chegou às Igrejas de Cristo. E com ela vieram as controvérsias. O Pr. Merlyn continua descrevendo este período dizendo:


"Os outros missionários se colocaram na defensiva. Alguns declararam sua objeção ao ensino carismático e escreveram cartas e panfletos. Um livro sobre a teologia do falar em línguas foi traduzido. Outro missionário tentou evitar que esta doutrina e a de línguas os dividisse ou às igrejas".29


Um outro fator determinante para o avivamento das Igrejas de Cristo em nosso país foi a adesão de membros de origem pentecostal-carismática. Eles aceitaram os ideais do Movimento de Restauração e deixaram as sólidas amarras denominacionais pela liberdade que há no Espírito. No entanto, trouxeram com eles aquilo que consideravam parte da mensagem do Novo Testamento: o enchimento e os dons do Espírito Santo. No Chile não apenas indivíduos, mas diversas igrejas pentecostais aderiram ao Movimento de Restauração pelas mesmas razões. Sobre este período da Igreja de Cristo no Brasil confira as palavras do Pr. Ozório Gonçalves:


"Enquanto todas as denominações se dividiram, por causa do avivamento espiritual, dando as igrejas Batista tradicional e renovada, Presbiteriana tradicional e renovada, Metodista tradicional e renovada, etc., as Igrejas de Cristo não se dividiram."30


Parece que o Espírito Santo de Deus usou "aquele outro missionário", citado acima pelo Pr. Merlyn, para evitar que a Igreja de Cristo no Brasil se dividisse!!! "No Essencial, Unidade; Nas Opiniões, Liberdade; Em Todas as Coisas, o Amor". É por essa e inúmeras outras razões que sou um apaixonado pelo Movimento de Restauração e a cada dia mais comprometido com a Igreja de Cristo no Brasil.


Conclusão


O Movimento de Restauração, quer queiramos ou não, inegavelmente começou no Grande Avivamento em Cane Ridge. O grupo conhecido como os "cristãos" e liderado por Barton W. Stone é cerca de vinte anos mais velho do que o ramo iniciado por Thomas e Alexander Campbell. Quando Barton W. Stone e seus companheiros estavam deixando as posições sectárias da denominação a qual pertenciam, Alexander Campbell ainda era um adolescente na Irlanda. Quando ele chegou aos EUA o grupo "stoneísta" do Movimento de Restauração já estava em curso e só aproximadamente quinze anos depois foi que eles se conheceram.


Segundo Leroy Garrett, estes fatos contribuem para corrigir um erro histórico e muito comum, que o Movimento de Restauração teve início com Alexander Campbell,31 que na verdade foi o nosso principal teólogo e organizador no século XIX.


Também é inegável que em Cane Ridge houve um legítimo avivamento e que Barton W. Stone sempre o considerou uma boa obra. As igrejas que surgiram deste avivamento cresceram por vários Estados norte-americanos e elas usavam táticas avivalistas de evangelismo, segundo o padrão do Segundo Grande Avivamento.


É impossível esconder que, no ano da unificação dos movimentos de Stone e Campbell, os "cristãos" eram cerca de 20 mil irmãos e representavam dois terços (2/3) da membresia do nosso movimento em 1832. Portanto, a maioria das igrejas do Movimento de Restauração eram avivadas!!!


Também é evidente que Barton W. Stone e muitas das igrejas que continuaram debaixo de sua influência até o ano de 1844, quando este dormiu no Senhor, permaneceram com suas práticas avivalistas sem comprometer a unidade do Movimento de Restauração.


Que a unidade de grupos tão distintos só foi possível para os pioneiros porque a união cristã não era meramente retórica. Eles, de fato, puseram em prática o nosso mais antigo lema: "No Essencial, Unidade; Nas Opiniões, Liberdade; Em Todas as Coisas, o Amor".32


Que aqueles que querem impor como condição de comunhão a uniformidade doutrinária em assuntos que não são essenciais estão na contramão do Movimento de Restauração. Ao agir assim estão trocando a liberdade que foi tão cara a Barton W. Stone, Thomas Campbell, Alexander Campbell e outros pioneiros por uma retórica de liberdade.


Que o Espírito Santo deve ter liberdade para se mover entre nós, pois, o cristianismo sem o mover sobrenatural de Deus não é bíblico nem apostólico, mas mera filosofia humana. E que a plenitude do Espírito Santo está disponível para todos os cristãos hoje e buscá-la é uma experiência de avivamento espiritual, é restaurar a fé e a prática da Igreja do Novo Testamento.


Portanto, não devemos nos envergonhar da nossa herança avivalista nem escondê-la ou renegá-la. Pelo contrário, uma das nossas mais preciosas heranças recebemos das igrejas avivadas que surgiram do Grande Avivamento em Cane Ridge e que foram lideradas por Barton W. Stone, ou seja, a maioria das igrejas do Movimento de Restauração em suas primeiras décadas.


E, por fim, que a sexagenária Igreja de Cristo no Brasil, ainda jovem e renovada, é fruto de uma maneira brasileira de fazer a restauração do cristianismo bíblico. Ainda que, para alguns, lembre ou não o movimento homônimo norte-americano. Em nosso país, o Movimento de Restauração continua vivo e atuante!!!




Veni, Sancte Spiritus. Et emitte coelitus Lucis tuae radium.


Vem, Santo Espírito. E do teu lugar celestial envia a tua gloriosa Luz.




Pedro Agostinho Jr.,
Pastor da Igreja de Cristo.








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[1] Pentecostal é todo aquele tem origem no movimento iniciado na Rua Azusa, em Los Angeles, Califórnia (EUA) em 1906 e que crê que o batismo no Espírito Santo é uma experiência que está disponível para todos os cristãos após a conversão e que ele é evidenciado pelo dom de falar em línguas. Os pentecostais também crêem que todos os dons espirituais estão disponíveis hoje. São exemplos de denominações pentecostais as Assembléias de Deus e Igreja de Deus. Já os carismáticos têm origem nos anos de 1960 e 1970 durante a renovação das igrejas históricas. Entre os carismáticos não há unanimidade quanto ao batismo no Espírito Santo ser uma experiência posterior à conversão e nem sobre o dom de línguas ser a sua evidência inicial, embora muitos tenham adotado a posição pentecostal clássica.
Na década de 1980 surgiu um outro movimento chamado "A Terceira Onda" por C. Peter Wagner (a "primeira onda" foi o movimento pentecostal e a "segunda onda" o movimento carismático). "A Terceira Onda" ensina que a expressão "batismo com ou no Espírito Santo" se aplica melhor à experiência que acontece com todos os cristãos na conversão, especificamente no batismo nas águas. No entanto, crêem que várias e várias vezes na vida cristã, o crente tem experiências dinâmicas da presença do Espírito Santo que os capacita com poder para o testemunho e o serviço, e que são melhor definidas como "enchimentos", "revestimentos de poder" ou "plenitude do Espírito Santo". "A Terceira Onda" também ensina que a proclamação do Evangelho deve vir, normalmente, acompanhada por "sinais, maravilhas e milagres", segundo o padrão do Novo Testamento. Para saber mais sobre ela confira os livros abaixo indicados e disponíveis em português:


(1) Surpreendido pelo Poder do Espírito, Jack Deere, CPAD;
(2) Quando o Espírito Vem Com Poder, Dr. John White, ABU;
(3) Cessaram os Dons Espirituais?, org. Wayne Grudem, Editora Vida;
(4) Surpreendido pela Voz de Deus, Jack Deere, Editora Vida;
(5) Teologia Sistemática, Wayne Grudem, Editora Vida Nova;
(6) O Dom de Profecia no Novo Testamento, Wayne Grudem, Editora Vida;


2 WHITE, John, Quando O Espírito vem com Poder, pág. 34 e 35.
3 DEERE, Jack, Surpreendido pelo Poder do Espírito, pág.94 a 96.
4 WALKER, John, O Avivamento de 1800, pág. 4 a 6.
5 WAUGH, Geoff Waugh, Fire Fell: Revival Visitations, disponível na Internet.PO Box 629, Strathpine, Qld. 4077, Australia. E-mail: geoff@renewal.dialix.oz.au Internet: http://www.pastornet.net.au/renewal Reproduction is permitted as long as the copyright remains intact with the text.
6 WALKER, John, O Avivamento de 1800, pág. 4 a 6.
7 Ibdem.
8 Ibdem.
9 SOTO, Fernando, La Reforma Presente, pág. 24.
10 WHITE, John, Quando O Espírito vem com Poder, pág. 75.
11 Ibdem.
12 Semelhante ao som dos cães, grunhidos, sons não exprimíveis - nota do tradutor.
13 “Professar a religião” era uma expressão da época para descrever a conversão - nota do tradutor.
14 SOTO, La Reforma Presente (citando Hoke S. Dickson em “The Cane Ridge Readger”), pág. 25.
15 LATOURETTE, Kenneth Scott, A História da Expansão do Cristianismo, IV (Grand Rapids: Zondervan, 1970), pág. 192.192 a 194. (4) Ibid., pp. 192-93. (5) Ibid., p. 193. (6) Ibid., p. 194.
16 SOTO, Fernando, La Reforma Presente, pág. 23.
17 WHITE, John, Quando o Espírito Vem com Poder, pág. 76.
18 Ibdem.
19 Ibdem.
20 As Presbyterian, Methodist, and Baptist ministers all united in the blessed work at this meeting, when they returned home to their different congregations, and carried the news of this mighty work, the revival spread rapidly throughout the land; but many of the ministers and members of the synod of Kentucky thought it all disorder, and tried to stop the work.Soon a diversity of opinion sprang up, and they got into a Babel confusion.Como todas as principais denominações evangélicas da atualidade (presbiterianos, batistas, menonitas, assembleianos e etc.), em nosso movimento também houve excessos e erros no início. Some preached Arian, some Socinian, and some Universalist doctrines; so that in a few years you could not tell what was harped or what was danced . O arianismo, o socianismo e universalismo foram pregados por alguns, mas posteriormente, com o amadurecimento, esses rumos foram corrigidos.
21 ALLEN, C. Leonard, Raízes da Restauração, pág. 111 a 113.
22 STONE, Barton W., Revivals of Religion. Christian Messengers, 5 julho de 1831.
23 Ibdem.
24 Ibdem.
25 SOTO, Fernando La Reforma Presente, pág. 32
26 Ibdem, pág. 33.
27 GONÇALVES, Ozório, revista O Mensageiro das Igrejas de Cristo, Ano XXIX, No. 127, junho/julho de 2007, pág. 08 e disponível no site www.movimentoderestauracao.com .
28 SHIELDS, Merlyn Lee, O Movimento de Restauração no Brasil, pág. 03.
29 Ibdem.
30 GONÇALVES, Ozório, revista O Mensageiro das Igrejas de Cristo, Ano XXIX, No. 127, junho/julho de 2007, pág. 08 e disponível no site www.movimentoderestauracao.com .
31 GARRETT, Leroy, Restoration Review, Vol. 18, No. 7, setembro de 1976.
32 Confira o artigo que explica este lema nos sites www.movimentoderestauracao.com .

A Igreja de Cristo



Definição de igreja

O termo "igreja" é uma tradução da palavra grega "ekklesia" que significa "os chamados para fora". Nos tempos antigos, na Grécia, a palavra "ekklesia" se referia a um grupo de cidadãos livres convocados para uma assembleia com a finalidade de tratar assuntos públicos. É algo semelhante às assembleias nos condomínios residenciais dos nossos dias só que com uma dimensão muito maior. Portanto, "ekklesia" era uma assembleia dos cidadãos de um Estado autônomo (cidade ou região). Todavia, o Novo Testamento deu um conteúdo espiritual para a palavra "ekklesia" que passou a significar "um povo chamado para fora do mundo pecaminoso". Das 114 vezes que a palavra "ekklesia" aparece no Novo Testamento apenas três é com o sentido secular acima citado (At 19:32,39,41) e outras duas como uma referência à assembleia dos judeus (At 7:38; Hb 2:12).


Também precisamos esclarecer o que Igreja não é:


1) Não é uma denominação. É comum se referir às denominações como igrejas, essa maneira de usar a palavra "igreja" não aparece nas Escrituras. Henry C. Thiessen, teólogo batista, afirmou em seu livro “Palestras em Teologia Sistemática” que não há na Bíblia Sagrada relato de nenhuma denominação e que "devemos sempre nos lembrar que originalmente o Senhor preveniu contra tais divisões (1Co 1:1-17)” (Thiessen, 291);
2) Não é uma continuação melhorada do judaísmo, embora haja muitos irmãos que assim entendem. Compreendemos que o cristianismo é um vinho novo que foi colocado em odres novos (Mt 9:17);
3) Não é o Reino. Agostinho foi que começou a ensinar que a Igreja é o Reino de Deus sobre a terra, isso no início do século V (Willey, 474). É a Igreja Católica que faz essa confusão. Alguns em nossa família na fé também estão confusos e deles divergimos. O Reino é muito mais do que a Igreja. O Reino é o domínio ou governo de Deus, existe desde a eternidade, é invisível e espiritual. Quando a Igreja foi fundada em Atos 2, cerca de 33 d.C., o Reino já existia:
a) A Igreja começou com Jesus, é composta dos discípulos de Cristo e anuncia as boas novas do Reino (At 8:12; 19:8; 20:25; 28:23,31);
b) A Igreja testemunha do Reino (Mt 24:14);
c) A Igreja é o instrumento do Reino por onde o poder do Espírito Santo é manifestado através dos crentes (Mt 10:8; Lc 10:17);
d) A Igreja é a guardiã do Reino (Mt 16:19).


igreja universal e local
No Novo Testamento a palavra "igreja" é aplicada a um grupo de cristãos de qualquer tamanho:


1) Um pequeno grupo que se reúne em uma casa (Rm 16:5; 1Co 16:19);
2) Em uma cidade inteira (1Co 1:2; 2Co 1:1; 1Ts:1);
3) Em uma determinada região geográfica (At 9:31);
4) Ou no mundo inteiro (Mt 18:18; Ef 5:25).


Em sentido universal ou geral a "igreja" é representada por algumas figuras como:


1) Edifício de Deus (1Co 3:9,16,17; 2Co 6:16; Ef 2:20,22; 1Tm 3:15);
2) Corpo de Cristo (Ef 1:22-23; 3:6; 4:4,12,16; 5:23,30; Cl 1:18,24; 2:19; 3:15; 1Co 12:12-27; Rm 12:4);
3) Noiva de Cristo (2Co 11:2-3; Ef 5:24-25,31-32; Ap 19:7) entre outros.


Portanto, se conclui que a Igreja é universal (no mundo inteiro) e local (casa, cidade ou região geográfica).


O início da igreja e sua organização
A Igreja no sentido universal e o surgimento da primeira igreja local são coincidentes. A Igreja foi:


1) Fundada por Cristo (Mt 16:18; At 20:28b);
2) Estabelecida na cidade de Jerusalém, na Palestina, atual Israel (At 1:2);
3) Por volta do ano 33, nos dias dos reis romanos (Dn 2:44; At 2:1-47).


Portanto, nenhuma denominação ou grupo sectário tem o direito de dizer que é a Igreja verdadeira ou a única igreja (Thiessen, 296).
A Igreja em Jerusalém foi a primeira igreja local e:


1) Reunia-se no Templo e de casa em casa (At 2:46-47);
2) O número de membros passou dos primeiros 120 discípulos para 3.000 (Atos 2:41);
3) Depois o número de homens subiu para quase 5.000 (At 4:4);
4) Tinha um padrão doutrinário definido, os irmãos tinham comunhão e oravam juntos (At 2:42);
5) Praticavam o batismo nas águas (At 2:41);
6) Observavam a Ceia do Senhor (At 2:42,46);
7) Mantinham registro do número de membros (At 2:14,41; 4:4);
8) Reuniam-se para o culto (At 2:46);
9) Socorriam os necessitados (At 2:44-45);
10) Os apóstolos eram seus líderes, mas também escolheram diáconos (At 6:1-7).

Logo outras igrejas locais foram estabelecidas na:


1) Judéia (Gl 1:22; 1Ts 2:14);
2) Samaria (At 8:1,4-25);
3) Antioquia da Síria (At 11:20-30; 13:1);
4) Por toda a Ásia Menor, Macedônia, Grécia, Itália, Espanha e vários outros países foram estabelecidas e organizadas igrejas locais.


Os princípios de organização vistos na Igreja em Jerusalém acima, também são identificados nas demais. São evidências que indicam o fato da organização das igrejas os seguintes fatores:


1) Em todas elas eram eleitos oficiais eclesiásticos (At 14:23; Tt 1:5):
a) Na Igreja em Jerusalém além dos apóstolos foram eleitos diáconos (At 6:1-7);
b) Na Igreja em Éfeso havia presbíteros (At 20:17);
c) Na Igreja em Antioquia profetas e mestres (At 13:1);
d) Na Igreja em Filipos bispos e diáconos (Fp 1:1);
2) Tinham dia certo para a adoração e celebração congregacional (Jo 20:19,26; 1Co 16:2; At 20:7);
3) Mantinham um padrão de conduta e exerciam a disciplina (1Co 14:34; Mt 18:17; 1Co 5:13; Rm 16:17);
4) Levantam recursos para a obra do Senhor (1Co 16:1-2; 2Co 8:7-9; 9:6-7);
5) Enviavam cartas de recomendação umas às outras (At 18:24-28; 2Co 3:1; Rm 16:1-2; At 15:22-29).


Tudo isso evidencia algum tipo de organização (Thiessen, 297).


O fundamento e o cabeça da igreja
Certa vez Jesus perguntou aos discípulos o que o povo dizia sobre quem ele era (Mt 16:3-19). Depois de ouvir as várias respostas, Jesus fez a mesma pergunta para eles. Pedro disse: "Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo" (Mt 16:16). A esta declaração Jesus respondeu: "E sobre esta pedra edificarei a minha igreja" (Mt 16:18b). Várias outras passagens se referem a Cristo como uma rocha (Is 28:16; 1Pe 2:6; At 4:11-12) e o apóstolo Paulo em 1Co 3:10-17 afirma quem é o fundamento da Igreja dizendo: "Porque ninguém pode lançar outro fundamento, além do que foi posto, o qual é Jesus Cristo" (1Co 3:11).


Alexander Campbell, o principal teólogo da Igreja de Cristo no século XIX, foi inquirido sobre quem é cristão e ele respondeu dizendo:


“Um cristão é todo aquele que crê em seu coração que Jesus de Nazaré é o Messias, o Filho de Deus vivo, que se arrepende de seus pecados e lhe obedece em todas as coisas de acordo com a medida do seu conhecimento e com toda sua vontade.”


Para ele o reconhecimento de Cristo como Messias era a base para se unir à igreja. Assim, o essencial para nós é a confissão de fé afirmando o senhorio de Jesus Cristo. Como Alexander Campbell, também ensinamos que não se deve exigir nada mais para aceitar alguém na comunhão, pois a irmandade não pode ser condicionada a credos humanos. Portanto, o fundamento da Igreja é a afirmação de Pedro quando confessou a Cristo como o Messias, o Filho do Deus vivo. Jesus Cristo também é o Cabeça da Igreja, que é o seu Corpo, e somente a Ele a igreja está subordinada (At 2:14-35; Ef 5:22-23; Cl 1:13-20).


O governo da igreja
As denominações ou comunhões cristãs têm muitas formas de governo:


1) A Igreja Católica Romana tem um governo mundial sobre a autoridade do Papa;
2) A Igreja Episcopal tem bispos com autoridade regional e acima deles os arcebispos;
3) A Igreja Presbiteriana dá autoridade aos presbíteros na igreja local, aos Presbitérios a autoridade regional e aos Concílios a autoridade nacional;
4) As Igrejas Batistas, Congregacionais e muitas outras igrejas independentes não têm nenhuma autoridade acima da igreja local e a maioria delas têm um só pastor com um grupo de diáconos.


Embora alguns irmãos insistam que o Novo Testamento não prescreve nenhuma forma específica de governo das igrejas, mas sim princípios gerais de organização, nós entendemos que há um modelo neotestamentário: o governo congregacional representativo (a pluralidade de presbíteros na igreja local com funções de ensino e governo auxiliados pelos diáconos). O Novo Testamento mostra claramente essa pluralidade de presbíteros:


1) Em cada igreja (At 14:23);
2) Em cada cidade (Tt 1:5);
3) “Chame os presbíteros da igreja” (Tg 5:14);
4) “Rogo-vos, pois, aos presbíteros que há entre vós” (1Pe 5:1).


Os presbíteros dirigem a igreja local e têm autoridade para isso conferida pelo Senhor Jesus (At 20:28; Hb 13:17). Nesse sistema há sempre mais de um presbítero e o "pastor" ("pastor titular" ou "presidente") é um deles. Ele não tem autoridade sobre os demais nem trabalha para eles como empregado. Sua função é diferenciada pelo fato de trabalhar em tempo integral na "pregação e ensino" (1Tm 5:17) e desse trabalho deriva parte ou toda a sua renda (1Tm 5:18).


A missão da igreja
A missão das Igrejas de Cristo sobre a terra é, prioritariamente, glorificar a Deus (Rm 15:6,9; Ef 1:5-6,12,14,18; 3:21; 2Ts 1:12; 1Pe 4:11). Glorificamos a Deus:


1) Adorando-o (Jo 4:23-24; Fp 3:3; Ap 22:9);
2) Anunciando as boas notícias do Evangelho aos perdidos (Mc 16:15; At 5:42; 8:4);
3) Edificando os santos (Ef 4:15-16; 1Co 14:26);
4) E ajudando os pobres e necessitados (1Tm 5:816; Tg 1:27; At 6:1-6; Gl 6:10).


A colaboração entre as igrejas
Nos tempos do Novo Testamento cada igreja local era independente da outra, mas mantinham relações cooperativas umas com as outras. A Bíblia Sagrada fornece os princípios para a cooperação entre as igrejas:


1) Na solução de problemas como na eleição de Matias como substituto de Judas (At 1:12-26);
2) Na assistência às viúvas pobres (At 6:1-6);
3) No relato da conversão dos primeiros gentios (At 11:1-18);
4) Nas questões doutrinárias polêmicas com a formação do primeiro concílio das Igrejas de Cristo (At 15:1-35);
5) Na expansão do Reino de Deus com o envio de missionários (At 13:1-3);
6) No sustento dos mesmos (2Co 11:8-9; Fp 2:25; 4:15-18);
7) No encontro em Trôade (At 20:4-7)
8) No relatório da primeira viagem missionária (At 14:21-28);
9) Também podemos ver a cooperação como meio de assistência às igrejas (At 12:22-26; 14:21-23; 2Co 11:28).


A unidade da igreja
A unidade da Igreja é uma doutrina neotestamentária ensinada com muita clareza (Jo 17:20-21; Cl 1:18; 3:15; 1Co 12:13; Rm 16:17-18; Tt 3:10-11). Porém, não há unidade na Igreja de Deus em nossos dias. O autor da Teologia Sistemática mais aceita entre os batistas no final do século XX comenta sobre esse paradoxo dizendo:


“Vemos incontáveis denominações, às vezes bem semelhantes quanto ao ensino, competindo umas com as outras. E os relacionamentos entre os membros da Igreja local são às vezes caracterizados por indiferença e a até hostilidade aberta” (Ericksson, 438).


Mas, como surgiu o denominacionalismo? Confira abaixo uma explicação de como surgiu a Teoria Denominacional da Igreja:


“A palavra ‘denominação’ para descrever um grupo religioso passou a ser utilizada por volta de 1740, durante o início do Reavivamento Evangélico liderado por John Wesley e George Whitefield. Mas a teoria em si foi elaborada um século antes por um grupo de líderes radicais puritanos na Inglaterra e na América do Norte. O denominacionalismo, como originalmente era designado, é o oposto do sectarismo. Cada seita clama para si, exclusivamente, a autoridade de Cristo. Acredita-se que é o verdadeiro corpo de Cristo; toda verdade lhe pertence, e não a nenhuma outra religião, Portanto, por definição, a seita é exclusiva. A palavra ‘denominação’ é, por sua vez, um termo inclusivo. Ela implicava que cada grupo cristão chamado ou ‘denominado’ por um nome particular era apenas um membro de um grupo grande – a igreja à qual todas as denominações pertencem. A teoria denominacional da igreja insiste em que a verdadeira igreja não pode se identificar com uma única estrutura eclesiástica. Nenhuma denominação pretende representar toda a igreja de Cristo... Os verdadeiros arquitetos da teoria denominacional da igreja foram os Independentes ‘congregacionalistas’ do século XVII, que representavam a voz minoritária na Assembleia de Westminster (1642-1649). A maioria da Assembleia concordava com os princípios presbiterianos, e expressou suas convicções classicamente na Confissão de Fé de Westminster e no grande e no pequeno catecismo de Westminster... Essa fraternidade dissidente de Westminster articulou a teoria denominacional da igreja em algumas verdades fundamentais. Primeiro, considerava-se a incapacidade do homem de sempre enxergar a verdade com clareza, diferenças de opinião sobre a aparência da igreja são inevitáveis. Segundo, apesar dessas diferenças não envolverem fundamentos da fé, não são de menor importância. Cada cristão deve praticar aquilo que ele acredita que a Bíblia ensina. Terceiro, como nenhuma igreja detém a definitiva e completa verdade divina, a verdadeira igreja de Cristo nunca pode ser totalmente representada por apenas uma estrutura eclesiástica. Finalmente, o simples fato de separação, em si, não constituir cisma. É possível haver divisões e ao mesmo tempo estar unido em Cristo... Essa visão denominacional da igreja só encontrou pouca aceitação na Inglaterra onde a igreja desfrutava de uma posição favorável, mesmo depois que o Ato de Tolerância de 1689 reconheceu os direitos dos presbiterianos, congregacionalistas, batistas e quakers adorarem livremente... Poucos defensores da visão denominacional da igreja do século XVII vislumbraram as centenas de grupos cristãos que há hoje... Eles simplesmente sabiam que a intolerância tradicional e o derramamento de sangue em nome de Jesus não deveriam continuar. A forma denominacional da igreja, no final das contas, marcou os recentes séculos da história cristã não devido ao seu ideal, mas por ser melhor do que qualquer outra alternativa que tenha surgido” (Shelley, 340-342).


A Bíblia, todavia, não fala em nenhuma denominação e já vimos que a Igreja não é uma denominação. Portanto, “como crentes, deveríamos estar perseguindo a unidade, pois essa é a vontade declarada de Cristo para a Igreja” (Ericksson, 438). Por isso concordamos com Millard J. Erickson:


“Com certeza, os crentes devem desejar e buscar a concretização de uma unidade espiritual e, na medida do possível, o reconhecimento e a comunhão mútua. Cada pessoa e congregação terá que determinar até que ponto o envolvimento maior e a atividade cooperativa são coerentes com a preservação de suas convicções bíblicas e com o cumprimento da tarefa dada pelo Senhor” (Ericksson, 439).


As Igrejas de Cristo no Brasil ensinam o conceito que a Igreja é uma irmandade universal, demonstrando-o por meio da cooperação com as igrejas de outras comunhões, mantendo normas éticas de respeito e boa vontade para com elas. Também cremos na possibilidade da unidade de todos os cristãos e nos confraternizamos com pessoas de outras denominações cristãs, mediante a adoração, o estudo bíblico, a missão e o serviço, sempre que possível.


Todavia, não podemos e nem devemos esquecer a nossa herança na Reforma Presente do século XIX (Movimento de Restauração ou Movimento Stone-Campbell) que é caracterizado pela defesa do retorno ao Evangelho e à Igreja do Novo Testamento, apelo este que sempre fez parte da mensagem das Igrejas Cristãs e Igrejas de Cristo, desde seu início cerca de duzentos anos atrás, e que deve continuar sendo feito por nós hoje, sem nenhum sectarismo ou proselitismo, até vermos a plena unidade cristã ou Jesus voltar.
Pedro Agostinho Jr.,
Pastor da Igreja de Cristo














Fontes:


THIESSEN, Henry C. Palestras em Teologia Sistemática, Editora Batista Regular.
JIMENEZ, Pablo A. El Bautismo en la Iglesia Cristiana (Discípulos de Cristo), disponível na internet no site www.disciples.org .
ERRETT, Isaac. Nossa Posição: uma sinopse da fé e da prática da Igreja de Cristo, disponível na internet no site www.movimentoderestauracao.com .
SOTO, Fernando. La Reforma Presente (citando “Memoirs of Alexander Campbell”, de Robert Richardson).
JIMENEZ, Pablo A. La Cena del Señor en la Iglesia Cristiana (Discípulos de Cristo), disponível na internet no site www.disciples.org .
GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática, Vida Nova.
SIZEMORE, Denver. Lecciones de Doctrina Bíblica, volumen I, American Rehabilitation Ministries and The American Bible Academy, Joplin, Missouri (citando “Los Padres Apostólicos con Justino Martir y Irenaeus” de A. Cleveland Moxe, pág. 185 e 186).
ERICKSON, Millard J. Introdução à teologia sistemática, Vida Nova.
SHELLEY, Bruce L. História do Cristianismo ao alcance de todos: uma narrativa do desenvolvimento da Igreja Cristã através dos séculos, Shedd Publicações.