quinta-feira, 9 de setembro de 2021

QUEIMA DE LIVROS NO CANADÁ SERIA ATO DE OBSCURANTISMO RELIGIOSO?


Na decada de 90 uma tia minha pôs fogo em uma caixa com quase 200 gibis que eu havia doado para meu primo Carlos.
Nessa caixa havia coleções hoje raras de Batman, Superamigos, Novos Titãs, Calafrio, Mestres do Terror e outras raridades como Spektro, da Vecchi. A justificativa de minha tia muito religiosa é que havia muitas revistas de cunho satânico, na caixa.
Essa história me traumatizou pois tenho tradição religiosa cristã e nunca tive essa neura percebida em minha tia. Mas ao ler a notícia de que cerca de 5.000 livros e revistas como Asterix e Tintim foram queimadas no Canadá por escolas católicas o alarme disparou. Muitos acusaram o fato como um sinal de obscurantismo religioso. Por outro lado, como eu mesmo tentei argumentar, poderia ser um ato político extremista de natureza progressista. Qual seria a motivação por trás do fato? Tentei ir mais fundo na questão.
Comecei pesquisando sobre os fatos recentes envolvendo o catolicismo no Canadá e vi uma relação desse caso com a série de incêndios de igrejas católicas que os nativos canadenses fizeram como protesto. Percebi que há uma estreita relação do caso da queima de livros de cunho racista nas escolas católicas com a dos templos católicos incendiados. A conexão dos fatos se dá com o tema do racismo.
A queima de 08 igrejas católicas no Canadá, ocorrida entre junho e julho de 2021 (e pode continuar) começou após a descoberta de tumulos de 751 crianças nativas ocultas em covas rasas, em diversas escolas católicas daquele país.
Revoltado com essa descoberta, o povo nativo começou a incendiar igrejas como forma de protesto, pois os fatos descobertos refletiam um comportamento de segregação racial praticado nessas escolas, num tempo passado. A primeira igreja a sofrer incêndio em 21 de junho foi a igreja do Sagrado Coração, localizada na reserva indígena Penticton (Columbia Britânica).
Consta que havia pelo menos 130 escolas residenciais que funcionaram entre 1847 e 1996, com a missão de "integrar" as crianças indígenas à cultura branca que prevaleceu desde o século 18 no Canadá.
Um site afirma:
<< Os danos causados pelo sistema de Escolas Residenciais Indígenas, a violência individual e sistêmica, persistem no presente. O trauma é intergeracional, e as paisagens indígenas deste país estão povoadas por sepulturas de crianças desaparecidas", afirmou à BBC News o antropólogo Eric Simons, que trabalhou com a tribo Penelakut na detecção de túmulos. >>
Outro site afirma:
<< Justin Trudeau, primeiro-ministro do Canadá, afirmou em entrevista coletiva que as “assustadoras descobertas” dos túmulos obrigavam o país “a refletir sobre as injustiças históricas e contínuas que os povos indígenas enfrentam”.>>
Pense no seguinte:
Ao que parece, as revelações apontam para a possibilidade de estas pessoas terem sofrido atrocidades no período histórico passado, em que diversas crianças de povos nativos do Canadá eram retiradas a força de suas famílias e obrigadas a frequentar internatos administrados por entidades religiosas. Dados informam que 70% destas escolas eram católicas. Grande parte dessas crianças que foram a essas escolas nunca puderam reencontrar a família.
Então, vamos tentar concluir: se os incêndios de 08 igrejas foram inspirados num movimento anti racista, esse comportamento de algumas escolas católicas pegarem livros de cunho racista de sua biblioteca e queimarem publicamente foi apenas um ato simbólico, para demonstrar solidariedade ao povo nativo e quem sabe conter a onda de manifestações. Não queimaram suas próprias escolas mas buscaram demostrar que participam de um expurgo cultural, rompendo com quaisquer traços de racismo dentro de suas instituições.
Consta que os protestos em forma de incêndio são para que a igreja peça perdão. Em dezembro, o Papa receberá uma delegação de nativos para dialogar sobre o fato. Quem sabe pedirá o perdão desejado por esse grupo? Seria o correto, da parte do Vaticano. Mas isso seria arcar com processos de indenização.Talvez por isso, a relutância.
Essa parece ser a melhor explicação do fato noticiado. O que leva a concluir que o ato não foi uma demonstração planejada contra o progresso e a cultura. Não é o retorno do obscurantismo, "graças a Deus!"
- Franco Bonelli.
Grupo Bonelli Brasil e Afins

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