domingo, 2 de abril de 2017

A Doutrina da Trindade




por
Prof. Isaías Lobão Pereira Júnior


Glória sempre seja dada ao Pai
Glória ao Filho e ao Santo Espírito.
Um só Deus, supremo e redentor,
Por todos os tempos sem fim. Amém.
Salmos e Hinos nº. 35
 
A doutrina da Trindade, é talvez, a doutrina mais misteriosa e difícil que encontramos nas Escrituras. Por isto, é uma insensatez afirmar que podemos dar uma explicação completa sobre ela. Devido à natureza do assunto, só podemos saber, a respeito de Deus, e da Trindade, o pouco que as Escrituras nos revelam. A tripla personalidade de Deus é, exclusivamente, uma verdade da Revelação.
Antes de toda e qualquer criação, Deus era completamente auto-suficiente e todo-inclusivo. Tudo que existia era Deus; não havia nada que não fosse Deus. Sem início, Deus existe para sempre numa essência imutável, escolhendo eternamente ser a si mesmo a partir de sua natureza [1]. Além disso, o Ser supremo é infinito em cada uma de suas características, muitas que talvez nunca foram reveladas e nem poderiam ser entendidas pelos seres humanos. [2]
A razoabilidade da fé na Trindade transparece melhor quando confrontada com o monoteísmo e o politeísmo, em diálogo como a unidade e a pluralidade. No monoteísmo nos defrontamos com a solidão do Uno. Por mais rico e pleno de vida, inteligência e amor que ele seja, não terá jamais alguém do lado dele. Ele estará eternamente só. Todos os demais seres lhe serão subalternos e dependentes. Se comunhão houver, ela sempre será desigual.
No politeísmo na compreensão comum, temos a ver com a pluralidade de divindades, com hierarquias e diferenças de natureza, benéfica ou maléfica. Esvai-se a unidade divina.
A base para entender-se a Trindade é a personalidade de Deus. A Escritura apresenta-nos um Deus pessoal, Porque assim diz o Alto e o Sublime, que vive para sempre, e cujo nome é Santo: habito num lugar alto e santo; mas habito também com o contrito e humilde de espírito, para dar novo ânimo ao espírito do humilde e novo alento ao coração do contrito. Isaías 57:15.(NVI) Visto que o homem foi criado conforme a imagem de Deus, podemos compreender algo da vida pessoal de Deus pela observação da personalidade como a conhecemos no homem. [3]
Evidentemente, pela natureza das coisas, a personalidade divina é algo infinitamente superior à personalidade humana; mas é a única alternativa para um Deus pessoal é, cremos, um Deus impessoal. E quando afirmamos que Deus é impessoal, passamos a defender o primeiro dogma do ateísmo. Loraine Boettner, conhecido teólogo reformado, afirma que: se Deus existe, tem que ser pessoal. Não podemos adorar o Princípio do Absoluto, nem ter comunhão com um Poder Cósmico; e, afirmar que Deus é superpessoal, é iludirmos, com uma frase altissonante. [4]
Uma das objeções mais comuns alegadas contra a doutrina da Trindade é que ela implica no triteísmo, ou seja, a crenças em três Deuses. E como veremos adiante, a formalização histórica da doutrina se deu nas controvérsias anti-trinitárias. Porém, o fato é que, as Escrituras nos ensinam que há um só Ser, auto-existente, eterno e supremo, em quem são inerentes todos os atributos divinos. Tanto o Velho como o Novo Testamento ensinam a unidade de Deus.
A doutrina de um só Deus – Pai e criador – , constitui o pano de fundo e a premissa inquestionável da fé da igreja. Herdada do judaísmo, ela foi sua proteção contra o politeísmo pagão, o emanacionismo gnóstico [5] e o dualismo marcionita [6]. Para a teologia, o problema era integrá-la no âmbito intelectual como os novos dados da revelação especificamente cristã. Reduzimos à sua formulação mais simples, tratavam-se das convicções de que Deus Se havia dado a conhecer na Pessoa de Jesus, o Messias, ressuscitando-o dos mortos e oferecendo salvação aos homens por seu intermédio, e que Ele havia derramado Seu Santo Espírito sobre a igreja. [7]

A TRINDADE E O VELHO TESTAMENTO
O Velho Testamento não contém a plena revelação da existência trinitária de Deus, mas contém várias indicações dela. Esta revelação vai tendo maior clareza, na medida em que a obre redentora de Deus é revelada mais claramente, como na encarnação do Filho, e no derramamento do Espírito.
Alguns teólogos divergem quanto às provas bíblicas da Trindade no Velho Testamento. Berkohf não concorda que a distinção, muito utilizada, entre Iavé e Elohim, e o plural Elohim, sejam provas da doutrina. Segundo ele; é mais plausível entender que as passagens em que Deus fala de si mesmo no plural, em Gn 1:26; 11:7, contém uma indicação de distinções pessoais em Deus, conquanto não sugiram uma triplicidade, mas apenas uma pluralidade de pessoas. [8]
Porém, Klaas Runia [9], professor do Seminário Teológico Reformado Holandês, crê que Gn 1:26, indique a Trindade. A fórmula plural de Gn 1:26, possui caráter trinitário; trata-se, segundo ele, não de um plural majestático, como alguns querem, ou de um plural deliberativo, como outros interpretam, visto que isto era totalmente desconhecido dos hebreus. Tem sido considerado no mesmo nível de palavras como “água” e “céu”, que também aparecem no hebraico. A água pode ser imaginada em gotas individuais de chuva ou em termos da massa de água no oceano. O plural nesse caso aponta para a “diversidade na unidade”. Alguns crêem que o mesmo acontece com o plural Eloim que aparece em Gn 1:26. Runia segue o pensamento dos Pais da Igreja, que sempre se referiam a esta passagem como base para a elaboração dos conceitos trinitários.
Os escritores do Velho Testamento afirmam o monoteísmo divino. É a partir dele que se definiu a doutrina da Trindade. Deus é uno tanto no Antigo como no novo Testamento: Dt 6:4 “Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus, é o único Senhor”, Mc 12:29 “Respondeu Jesus: o principal é : Ouve, ó Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor!”; Ef 4:6 “(Há) um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, age por meio de todos e está em todos”.
Vemos aqui afirmações claras e inequívocas de monoteísmo: Deus é um só. Essa confissão de fé assinala Israel como uma nação absolutamente dedicada ao monoteísmo. Separa claramente a fé religiosa do Antigo Testamento de qualquer das formas de politeísmo.
Os nomes de Deus no Velho Testamento são importantes para entender a Trindade. Muito se escreveu desde o século passado em relação a este tema, principalmente a escola teológica liberal alemã, que baseou suas pesquisas nas diferenças no uso dos nomes de Deus em todo o Velho Testamento, dando origem a famosa teoria documental. [10]
No primeiro capítulo de Gênesis, verifica-se que os nomes de Deus estão no plural, Elohim, e, também, Adonai; e a estes plurais do nome divino, juntam-se em geral verbos e adjetivos no singular. Um fenômeno singular extraordinário, dado que em hebraico existe uma palavra singular El, para Deus. O texto de Deuteronômio, afirma em hebraico, palavras no plural: “Iavé, nosso Elohim, é um só Iavé”.
Isto mostra que Deus, o Senhor, na Sua maneira de ser e nos pactos firmados por Ele com os homens, é mais do que um, ainda que “um só Iavé”, quanto à essência do Seu ser.
Muito importante é o fato de que, começando no livro de Gênesis, e prosseguindo, cada vez mais com nitidez, através de outros livros do V. T., encontramos uma distinção entre Iavé e o Anjo de Iavé, que se apresenta como um em essência com Iavé, porém distinto d'Ele. Tal acontecimento, em que Deus toma a forma de um anjo ou de um homem, para falar, visível e audivelmente, ao homem é chamado de Teofania.
À medida que a revelação vai sendo desenvolvida, mediante uma sucessão de profetas, verifica-se que títulos divinos, e adoração divina, são dados a este Anjo, que Este os aceita; que Ele se revela como um Ser eterno, o Deus Todo-Poderoso, o Príncipe da Paz, o Adonai, o Senhor de Davi; que vai nascer de uma virgem; que Ele será desprezado e rejeitado pelos homens. Varão de dores e experimentado em trabalhos; que Ele levará sobre Si o pecado de muitos e que, acima de tudo, estabelecerá o reino de justiça, que aumentará até encher a terra.
Estas profecias, como o Novo Testamento mostra, foram cumpridas em Cristo, a Segunda Pessoa da Trindade.
Em geral, as referências, no Antigo Testamento, a respeito do Espírito Santo, eram tão indistintas, que pareciam referir-se apenas a uma energia ou influência, procedente de Deus. Em parte alguma se chama ao Espírito, especificamente, uma Pessoa; e, no entanto, quando se fala Dele, é em termos que poderíamos aplicar muito bem a uma pessoa.
Lidos à luz do Novo Testamento, porém, há muitas passagens em que se percebe que é uma Pessoa distinta. As Escrituras usam pronomes pessoais para indicar o Espírito Santo, elas revelam o Espírito não como uma força abstrata, um poder ou uma coisa, mas como “ele”.
Por exemplo, aquilo que é dito sobre Deus Pai é dito também a respeito do Espírito de Deus. A expressão “Deus disse” e “o Espírito disse” são repetidamente intercaladas. E as obras do Espírito Santo aparecem como obras de Deus.
Em Isaías 6:9, Deus diz: “Vai e diz a este povo”. No Novo Testamento é citado da seguinte maneira, At 28:25, começando com estas palavras, “Bem falou o Espírito Santo a vossos pais, por intermédio do profeta Isaías...” Nesse caso o apóstolo atribuiu o falar de Deus ao Espírito Santo.

A TRINDADE E O NOVO TESTAMENTO
O Novo Testamento traz consigo uma revelação mais clara das distinções da Divindade. Esta revelação foi feita na encarnação de Cristo, e no derramamento do Espírito Santo. Segundo Warfield, foi na vinda do Filho de Deus, na semelhança da carne do pecado, para se oferecer a Si mesmo com um sacrifício pelo pecado; e na vinda do Espírito Santo, para convencer o mundo do pecado, da justiça e do juízo, que a Trindade de Pessoas na Unidade da Divindade foi revelada, de uma vez para sempre, aos homens. [11]
O texto básico para discutir-se a divindade do Filho é João 1:1-2, 14.
No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade. (ARA)
O vocábulo Verbo, é traduzido por “Palavra” nas versões modernas, como a NVI, BLH e Bíblia de Jerusalém. O vocábulo original para Verbo é Logos. O termo indica que o Logos é uma Pessoa divina, que estava no princípio da Criação. Interessante notar que na Septuaginta, versão grega do A.T., a construção poética de Gênesis 1 tem um paralelo formidável com este texto de João.
A expressão de João que o Verbo era Deus, indica a divindade do Verbo, e o verso 14, indica a sua humanidade, quando afirma que ele habitou entre nós.
O Espírito Santo é apresentado como a terceira pessoa divina, ligado ao Pai e ao Filho, mas distinto deles, da mesma forma que o Pai e o Filho são distintos um do outro. A sua individualidade está dentro da unidade de Deus. A própria palavra santo sugere sua divindade. Jesus declara que o nome de Deus, em que devem ser batizados aqueles que se tornam seus discípulos, é tripessoal. [12]

CAMINHOS EQUIVOCADOS
Os servos da congregação que estão encarregados do Salão do Reino dar-lhe-ão boas vindas com rostos sorridentes e braços abertos. Eles falarão do amor que encontraram na Organização de Deus, a Sociedade Torre de Vigia, a religião das Testemunhas de Jeová. [13]
As palavras de David Reed, são um alerta para a Igreja. Apesar do zelo, do cuidado, da postura quase cristã, as Testemunhas de Jeová negam a autoridade das Escrituras, negam a divindade de Cristo e do Espírito, bem como sua pessoalidade. A Trindade para eles é uma forma de politeísmo pagão.
Para muitos crentes alheios à história da igreja, este discurso se apresenta como novidade. E mesmo as Testemunhas de Jeová desconheciam seus antecedentes históricos. Sua postura teológica é ariana. De acordo com o bispo Ário do quarto século. Que negava a preexistência de Cristo, afirmando que ele tinha sido criado pelo Pai. Cristo era divino, mas não em igualdade com o Pai.
Segundo Gordon D. Fee, hoje eles se declaram arianos auto-conscientes, em uma nota de seu livro, “Paulo, o Espírito e o Povo de Deus” [14] , Fee afirma:
“Foram necessárias muitas décadas para as Testemunhas de Jeová descobrissem que eram arianos. Desde aquele dia eles cessaram de 'testemunhar' a respeito do assunto do 'reino', como era sua praxe, e em vez disso adotaram seu arianismo antitrinitário com total e intencional vigor”. [15]
Quais são as distorções da doutrina da Trindade? Pode-se dividir didaticamente em três principais:

a) Pai, Filho e Espírito Santo, três modos de aparecer do mesmo Deus.
O Modalismo.

O termo foi cunhado por Adolf Von Harnack, no século XIX. Diz a doutrina: Deus é um e único. Ele funda uma monarquia cósmica, pois somente Ele é senhor sobre todas as coisas. É por Ele que os reis e governadores governam. Entretanto, em sua comunicação com a história, este Deus único se mostrou sob três modos. A mesma e única divindade aparece sob três rostos e mora em nosso meio de três maneiras diferentes como Pai, Filho e Espírito Santo. O mesmo Deus enquanto cria e nos entrega a Lei se chama Pai; o mesmo Deus enquanto nos redime se chama Filho; e o mesmo Deus enquanto nos santifica e nos dá sempre a vida se chama Espírito Santo. O mesmo Deus teria três pseudônimos. Deus é indivisível, não existe comunhão de três pessoas nele; o que existe é a unicidade divina projetando para nós mediante três modos diferentes.
O modalismo foi condenado insuficiente para expressar a fé cristã na Trindade. No batismo de Jesus, foram manifestadas a três pessoas distintas da Trindade - o Pai falando do céu, o Filho saindo das águas, e o Espírito repousando sobre Ele (Mc 1:11). Nos evangelhos, encontramos Jesus, freqüentemente, fazendo menção do Pai como outra Pessoa. Muitas vezes Ele se dirigia ao Pai em oração (João 17).

b) O Pai é o único Deus, o Filho e o Espírito Santo são criaturas subordinadas.
Subordinacionismo

Afirma-se também a unidade de Deus, em detrimento as outras pessoas divinas. Deve-se tributar prudente veneração a Jesus Cristo, mas não ao ponto de igualá-lo a Deus mesmo, pois tal excesso destrói o sentido autêntico de Deus. Ele pode ser semelhante (homoioúsios) a Deus, jamais porém igual (homooúsios) a Ele. Ele é a primeira criatura, o protótipo de todas as criaturas, mas não Deus.
Ário é o teólogo mais influente que defendeu esta tese. Ele e seus discípulos enfatizavam o fato de que Jesus foi um ser humano perfeitíssimo, porque ele estava cheio do Espírito. Nota-se uma influência muito grande do pensamento filosófico grego em Ário. Para ele o Logos de João não é Deus. Pois Deus não pode se comunicar com o mundo, Ele é um mistério indecifrável e transcendente. Sua natureza é incomunicável, portanto, para ser conhecido Ele tem que se servir de um mediador, o Logos. Este Logos não é Deus, mas pertence a esfera divina. Jesus, cheio do Espírito, alcançou a perfeição a ponto de merecer um nome divino. Foi adotado pelo Pai como seu filho. O filho permanece sempre subordinado ao Pai, porque foi criado ou gerado pelo Pai. Também é chamado de subordinacionismo adocianista ou monarquismo dinâmico, porque, para eles, Jesus mereceu ser adotado pelo Pai.
Ele é a criatura mais semelhante ao Pai que se possa conceber (homoioúsios), sem entretanto chegar à igualdade de natureza com o Pai (homooúsios). Os críticos sempre se deleitaram em escarnecer a doutrina da Trindade, porque afirmavam que ela era uma disputa de loucos, sem relevância, pois os teólogos se digladiavam por um iota.
Esta corrente pretendia fazer justiça a duas doutrinas básicas da fé. A unidade de Deus, pois não há ninguém igual a Ele e, ao mesmo tempo, ele possui um Primogênito, perfeito, divino porquanto foi adotado por Deus, e proposto como mediador, salvador e caminho exclusivo de acesso ao Pai.
O Concílio de Nicéia (325) refutou a doutrina de Ário, e afirmou que Jesus Cristo é o único Filho de Deus. “Cremos em um só Senhor Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, gerado desde a eternidade do Pai: Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro; gerado, não criado, consubtancial ao Pai”.
Mas ao afirmar a divindade de Cristo, tem que se lembrar que Ele optou esvaziar-se e tornar-se submisso ao Pai. Mantendo na Trindade uma subordinação, mas não como afirmou Ário.
 
c)O Pai, o Filho e o Espírito Santo são três deuses.
O Triteísmo

O triteísmo afirma as três Pessoas divinas. Acredita na divindade do Filho, na Pessoa do Espírito como Deus em igualdade. Mas são três substâncias independentes e autônomas. Não se afirma a relação entre elas nem a comunhão como constitutivo da Pessoa divina. A Trindade transforma-se em três deuses. Somam-se os três divinos, como se atrás de cada Pessoa não houvesse um Único. Existem então três absolutos e não um, três seres eternos e não um, e três criadores e não um.
A afirmação trinitária destaca a existência objetiva de três Únicos, Pai, Filho e Espírito Santo. Mas não os vê separados e não-relacionados. Crê que as Pessoas da Trindade estão eternamente relacionadas em comunhão infinita. Pode-se dizer, há três Pessoas de uma única comunhão.
O termo usado para explicar a comunhão das Pessoas da Trindade é pericórese, (latim, circumincessio). O sentido seria o fato de envolver - circum - e entrar numa profunda intimidade. Cada membro da Trindade, em algum sentido, habita no outro, sem diminuição da total pessoalidade de cada um.

TRINDADE ONTOLÓGICA E TRINDADE ECONÔMICA
Ao discutir a doutrina da Trindade, temos que distinguir o que é tecnicamente conhecido como Trindade Ontológica e Trindade Econômica.
Por Trindade Ontológica, entende-se a Trindade que subsiste na Divindade, desde toda eternidade. Na sua vida essencial e inata, dizemos que o Pai, o Filho e o Espírito Santo são os mesmos em substância, possuindo atributos e poderes idênticos e, portanto, são iguais em glória. Isto diz respeito à existência essencial de Deus.
Por Trindade Econômica, significamos a Trindade tal como se manifesta no mundo, especialmente na redenção do pecador. Existem três obras adicionais, se assim podemos descrever, que são atribuídas à Trindade, a saber, a Criação, a Redenção e a Santificação.
Encontramos nas Escrituras que o plano da redenção toma a forma de um pacto, não só entre Deus e o Seu povo, como também entre as várias Pessoas dentro da Trindade, de maneira que há, por assim dizer, uma divisão de tarefas, cada Pessoa tomando, voluntariamente, determinada fase da obra.
Ao Pai atribui-se, em primeiro lugar, a obra da Criação, assim como a eleição de certo número de indivíduos que Ele deu ao Filho. Ao filho atribui-se a obra da Redenção, para o cumprimento da qual se encarnou, tomando a natureza humana, de forma que, como representante de seus eleitos, assume a culpa do seu pecado, para resgatá-los da morte. Ao Espírito Santo são atribuídas as obras de Regeneração e de Santificação, ou a aplicação aos corações dos indivíduos, da expiação objetiva que Cristo realizou. Ele faz isto renovando espiritualmente os corações, operando neles a fé e o arrependimento. E glorificando-os finalmente no céu.
A redenção, pois é um assunto da graça soberana, planejada antes da fundação do mundo, apresentada na forma de um pacto ou aliança. Não é um plano departamentalizado, dispencionalizado ou repartido, mas é uma ação global que envolve toda a Pessoa da Trindade. Ela é planejada pelo Pai, comprada pelo Filho, e aplicada pelo Espírito Santo.

A TRINDADE E A JUSTIFICAÇÃO
Como um Deus perfeitamente santo pode prover perdão aos pecadores? A análise tem que passar necessariamente pela impossibilidade do Deus uno salvar e pela possibilidade lógica da pluralidade divina salvar o pecador.
Para Scott Horrell, o Deus uno se comprometeria em sua santidade para providenciar a salvação [16]. Se Deus fosse uma só pessoa, ele poderia ser perfeitamente justo e santo, mas seria incapaz de perdoar os nossos pecados sem comprometer sua santidade. Por exemplo, no islamismo, Alá fica acima da ponte da morte que passa da via terrestre para o paraíso. Embaixo da ponte estreita fica o abismo do inferno. Um homem que teve uma vida 70% boa e 30% má talvez tenha permissão de passar para o paraíso e para a presença de Deus. mas um homem com menos virtude seria empurrado por Alá para o abismo. Pressupondo que nenhum homem é 100% bom ( e assim moralmente igual a Alá), Alá deve comprometer sua santidade ao permitir qualquer pessoa entrar no paraíso.
Como é que o Absoluto Moral do universo pode perdoar e Ter comunhão com um pecador? Na Bíblia, Deus é justo mas também o Justificador de nossos pecados (Rm 3:23-26), precisamente porque ele é mais do que uma pessoa. Por causa da pluralidade de pessoas, o Deus Triúno pode ser o Santo Juiz sem se comprometer, o Cordeiro sacrificial que morreu em meu lugar e o Espírito santificador que atua em mim.

NOTAS:
[1] — J. Scott Horrell. Uma Cosmovisão Trinitária, in Vox Scripturae. 4 (março de 1994).
[2] — Vale destacar várias obras que discutem os atributos de Deus, entre elas, Louis Berkof, Teologia Sistemática. - James I. Packer. O Conhecimento de Deus. - João Calvino. As Institutas da Religião Cristã.
[3] — Louis Berhof. Teologia Sistemática. Luz para o caminho. 1990.
[4] — BOETTNER, Loraine & WARFIELD, Benjamin. A Doutrina da Trindade. Leira: Edições Vida Nova.
[5] — O Gnosticismo foi uma heresia refutada pela igreja primitiva. Ele afirmava entre outras coisas, que o corpo de Jesus Cristo não era real, era apenas uma emanação (ilusória) da divindade.
[6] — Márcion (85-160 d.C.) Defendia que a matéria era má, enquanto valorizavam o espírito, a salvação proposta por Cristo, era só para o espírito, não incluía o corpo. Ele rejeitava o Deus do Antigo Testamento, porque achava que este era um Deus cruel.
[7] — J.N.D. Kelly. Doutrinas Centrais da Fé Cristã. São Paulo. Edições Vida Nova.1994.
[8] — Louis Berkohf. Teologia Sistemática. Luz para o Caminho. 1990.
[8] — Trindade, in KEELEY, Robin. Fundamentos da Teologia Cristã. Editora Vida, pp. 109-116.
[10] — Para maiores esclarecimentos veja. Gehard Von Radd. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo. ASTE. 1965, para a defesa da posição liberal, e Gleason Archer. Merece Confiança o Antigo Testamento? São Paulo. Edições Vida Nova. 1990, para a refutação conservadora.
[11] — Benjamin B. Warfield. A Doutrina da Trindade. Portugal. Edições Vida Nova. pp 135.
[12] — Portanto vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; Mateus 28:19 (NVI).
[13] — David Reed. A Liberdade Religiosa versus o Domínio da Torre de Vigia das Testemunhas de Jeová. In Defesa da Fé, nº. 5 julho/setembro 1997.
[14] — Gordon D. Fee é um erudito pentecostal, especializado em estudos do Novo Testamento. Ele já lecionou no Seminário Gordon-Conwell, em Boston, e hoje está no Regent College, em Vancouver, Canadá. O livro citado foi publicado pela United Press em 1997. Campinas, SP. Para Fee a experiência carismática leva-nos a um entendimento mais profundo da Trindade. Veja também, Tom Smail. A Pessoa do Espírito Santo. São Paulo. Editora Loyola.
[15] — Gordon D. Fee. Paulo, o Espírito e o Povo de Deus. Campinas. United Press. Pp 52
[16] — J. Scott Horrell. Uma Cosmovisão Trinitária. Op.cit.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARCHER, Gleason. Enciclopédia de Dificuldades Bíblicas. Trad. Oswaldo Ramos. São Paulo: Editora Vida,1997. 479 pp.
BARTH, Karl. The Holy Ghost and the Christian Life. Translated by R. Birch Hoyle. London: Frederick Muller Limited, 1938. 86 pp.
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Trad. Odayr Olivetti. Campinas: Luz para o Caminho Publicações, 1990. 791 pp.
BOETTNER, Loraine & WARFIELD, Benjamin. A Doutrina da Trindade. Leira: Edições Vida Nova. 176 pp.
FEE, Gordon D. Paulo, o Espírito e o Povo de Deus. Trad. Rubens Castilho. Campinas: Editora United Press, 1997. 222 pp.
HORRELL, John Scott. O Deus Trino que se dá, a Imago Dei e a Natureza da Igreja Local. In Vox Scripturae. Revista Teológica Latino-Americana: volume VI, número 2. Dezembro, 1996. 243-262 pp.
HORRELL, John Scott. Uma Cosmovisão Trinitária. In Vox Scripturae. Revista Teológica Latino-Americana: volume IV, número 1. Dezembro, 1994. 55-77 pp.
JÜNGEL, Eberhard. La doctrina de la Trinidad. Trad. Arnoldo Canclini. Miami: Editorial Caribe, 1976. 152 pp.
KEELEY, Robin.(org) Fundamentos da Teologia Cristã. Trad. Yolanda Krievin. São Paulo. Editora Vida, 2000. 344 pp.
KELLY, J.N.D. Doutrinas Centrais da Fé Cristã. Origem e Desenvolvimento. Trad. Márcio L. Redondo. São Paulo: Edições Vida Nova, 1994. 390 pp.
SPROUL, R.C. O Mistério do Espírito Santo. Trad. Bentes traduções. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1997. 192 pp.



 
 


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